quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Um Brasil vítima da burocracia governamental e do aquecimento global

Samantha Quitéria Albuquerque, conhecida como Shasha, é aluna de pós-graduação em sociologia e funcionária pública de um centro de apoio a imigrantes. Mulata, descrita pelo autor como uma mulher com "olhos de lince", ela é a protagonista do romance Ordem e Progresso, escrito por P.P.F. Simões. A personagem, apesar de namorar um homem rico que não se preocupa em lhe dar prazer, é narrada como uma heroína feminista em um universo machista e repleto de contradições que é tanto o Brasil de hoje quanto o país descrito no livro.

Simões parece oscilar, em sua narrativa, entre um local idêntico ao que vivemos na realidade e outro mundo, afetado pelo aquecimento global, que parece mais próximo de uma distopia futurista. A repartição pública onde Samantha trabalha passa a ser abarrotada de imigrantes. Eles fugiram de seus países após serem afetados por tornados, terremotos e todo o tipo de desastre natural. O cenário de Ordem e Progresso é o Brasil, que não foi afetado por nenhum desses incidentes.

A escrita do autor do livro, que estreia neste romance publicado pela editora Novo Século, é leve e acessível. O único defeito da narrativa de Simões é o excesso de adjetivações que ele coloca para os personagens, para as sensações e para todo o contexto da história. A protagonista feminina e seus colegas de trabalho - Ana Carolina, Bruno e Henrique - ganhariam mais com mais descrições sobre a situação de abandono que vivem no serviço público, o que é um problema real na sociedade brasileira. O autor, partindo para a ficção, também narra que os militares brasileiros montam uma espécie de campo de concentração para exterminar imigrantes. O conceito é interessante, mas parece muito fora da realidade do que o país faria em uma situação de excesso de população entrando em seu território, especialmente com sua infraestrutura precária para gerar uma repressão eficiente.

Mesmo com essas ressalvas, o livro trabalha bem, de maneira simples, todo o seu lado real e ficcional. Ponto alto para o narrador que exerce auto-crítica inclusive sobre suas próprias percepções sobre Samantha Albuquerque. Utilizando um recurso que já foi explorado em obras de Machado de Assis, Simões tenta conversar com o leitor ao longo dos capítulos, fazendo, inclusive, comentários sobre o seu próprio estilo de escrita.

O livro vale a pena para quem quer conferir um novo autor ou temas como sustentabilidade, funcionalismo público e uma simples ficção que consegue agregar esses assuntos. Os temas são atuais e poucos explorados. A dica para o escritor desse livro fica apenas para ele amadurecer certos aspectos de sua literatura, evitando alguns adjetivos que sobram e valorizando mais as descrições que ele coloca no papel, apostando num estilo com maior verossimilhança.

PS: O autor entrou em contato com o blog e nos enviou um exemplar pelo correio para que alguém do Bola fizesse uma resenha. Gostamos muito da iniciativa e o texto foi escrito com imparcialidade.

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