terça-feira, 30 de setembro de 2008

Festival do Rio - premier do aplaudido filme "Juventude" e chop com Marieta Severo

Aconteceu ontem, às 22h no Cinema Odeon, na cinelândia, a premier do filme "Juventude", de Domingos de Oliveira.

Domingos caminhou ao lado da sua amada mulher, a atriz Priscila Rozenbaum, no tapete vermelho. Estavam às luzes dos inúmeros fotógrafos que por vezes irritaram as celebridades presentes no evento como Camila Pitanga (e seus profundos e elegantes decotes), Marieta Severo, Caio Blat (de paletó e camiseta aberta declarando a opção eleitoral "Gabeira") e a mulher, a atriz Maria Ribeiro. Os atores do filme também estavam presentes, como o ator Paulo José e a atriz de Jogo de Cena e única mulher do "Juventude", Aleta Vieira, 22 anos.

O filme foi recebido com três sessões de aplausos. O cinema estava lotado e era difícil conseguir um lugar no grande cinema Odeon. O filme conta a história de três 'garotos da 3ª idade', David Antônio (Domingos de OLiveira) e Ulisses. Eles foram amigos a vida toda e encontram-se para comemorar os 50 anos desde que se conheceram na escola, ao encenarem o clássico português "A Cia dos Cardeais". Fazem um balanço de suas vidas e, em especial, dos seus passados e atuais amores. O filme é de uma sensibilidade incrível e é evidente o quando da pessoa genial que é o ator, diretor e mestre Domingos de Oliveira. Muitas das frases incríveis que Domingos falava em conversas ou no palco, no dia do seu aniversário, foram ouvidas no filme.

Após a sessão, a equipe inteira do "Juventude", os amigos de Domingos de Oliveira (Caio Blat, Maria Ribeiro, Marieta Severo, Paulo José e companhia) e a repórter do Bola da Foca, Luma Ramiro Mesquita, quem vos escreve, foram tomar um chop e conversar.

Desculpe a primeira pessoa, mas eu estava lá fazendo o mesmo que eles. Tomamos um chop no bar ao lado do cinema Odeon. Alguns, tomaram vários chops. A mesa, era grande, 6 mesas juntas não foram suficientes para todos ocuparem um lugar, mas nada como uma apertadinha para todos comemorarem num brinde: "À Juventude!". Se a mesa era grande, melhor sair antes para não ver a conta: duzentos e tantos reais, em menos de uma hora! A repórter que vos fala tomou apenas um chop, mas contribuiu com 10 reais, afinal, faltava dinheiro para pagar a conta e, infelizmente, a idéia de sair antes da mesa só me veio tarde demais.

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Festival do Rio 2008 - cinema, premier, festas, Domingos de Oliveira e imprensa


Olá, queridos amigos focas e não focas!

Estou escrevendo direto da Cidade Maravilhosa. Vim cobrir o Festival do Rio e trago muitas novidades! Escrevo da sala de imprensa principal, na Rua Tefé, 75. Perguntei, em inglês para a moça que está ao meu lado, também escrevendo, mas ela também não sabe se aqui também é um cinema. Parece que sim. E lindo! A construção é antiga e lembra a Estação da Luz.

Enquanto estou sem cabo ou sem internet para passar as minhas fotos, fui colocar a bateria da Nikon D80 para carregar. Hoje tenho duas premiers (ou premieres), quem sabe!

Uma premier é do filme do (depois da festa de aniverário dele, já fiquei íntima! rs) Domingos de Oliveira, que está com dois filmes no festival e o outro é do português, que foi para Cannes e está no Canadá també, "Aquele querido mês de agosto", de Miguel Gomes e produção de Luiz Urbano, com quem acabei de conversar.

Ele contou que é um filme com duas partes. A primeira é um documentário, com as festividades do mês de agosto, os fogos, as queimadas, o amor, os estrangeiros portugueses voltando para comemorar. A segunda parte é um romance, ficção, com atores amadores, encontrados durante o documentário. Triângulo amoroso e incesto são temas do filme que verei mais tarde. Depois conto como foi.




fotos: divulgação - Aquele querido mês de agosto


Ontem vi um filme matavilhoso! "Abaixando a máquina", de Guillermo Planel e Renato De. O filme é incrível! Sobre fotojornalistas que trabalham aqui no Rio. É muito interessante observar esse "making off" da realidade aos jornais. Almocei com eles antes da sessão. Um dos produtores mora na Mansão dos Arquitetos, onde estou passando nesses dias.

É uma casa linda. Mansão mesmo! Numa parte bem alta do Rio (com vista maravilhosa!), em Santa Teresa. Cada cômodo, parece ter o tamanho da minha casa inteira. As escadarias são de ferro, todo detalhado, lindas! As portas são enormes, assim como as janelas.

Enquanto minha credencial não sai, vou escrevendo.

Acabo de conhecer o Pablo, um cineasta Argentino que também está aqui usando a internet. Ele estará com um filme na mostra de São Paulo, em poucas semanas. Me deu o filme e vou passá-lo na Faculdade Cásper Líbero, o quanto antes. Se chama "El Bosque". Ele também está procurando uma produtora para o filme "Ceremonia", que fala sobre Mateo, um matador de aluguel. Segundo a sinopse que ele acaba de me dar, "o orgulho, a violência e o passado se encontram em um lugar do qual é impossível escapar".


Volto em breve, com mais informações.


Minha credencial saiu.


Besitos!


sábado, 27 de setembro de 2008

Mais uma lenda que se vai...

Quando o mundo das artes estava começando a se recuperar da perda de Rick Wright, outra grande lenda nos deixa. Paul Newman, um dos maiores atores que o mundo já viu morreu na manhã deste sabádo. Newman, de 83 anos, sofria de câncer há algum tempo, apesar dele ou sua família nunca terem confirmado a doença oficialmente.

Vencedor do Oscar de melhor ator por "A cor do dinheiro", Newman era um dos últimos remanescentes da "era de ouro" de Hollywood. Início sua carreira com uma péssima interpretação, segundo ele próprio, em "Cálice Sagrado" de 1954. Mas foi interpretando o boxeador Rocky Graziano em "Marcado pela Sarjeta", de 1956, que chamou a atenção do público pela primeira vez. Era um dos maiores galãs da época, com um físico imponente e chamativos olhos azuis. Além do já citado Oscar, Newman concorreu outras nove vezes ao prêmio da academia, recebendo também um Oscar pelo conjunto de sua obra. Entre seus filmes mais marcantes está "Butch Cassidy", onde trabalha com seu parceiro em muitas outras obras, Robert Redford.

Mas Paul Newman tinha outra grande paixão em sua vida, paixão essa que para amigos e familiares superava o cinema: o automobilismo. Dono de uma equipe na Formula Indy americana, a Newman-Hass, Paul não era apenas um figurão, também competia. Começou com o hobby nos anos 70, com corridas de prototípos. Chegou a disputar a famosa 24 horas de Le Mans, onde foi segundo colocado e venceu as 24 horas de Daytona. Assim, não é de se estranhar que tenha se despedido do cinema interpretando justamente uma lenda das pistas, dando voz a um Hudson Hornett 1950 no animação "Carros", da Pixar. Seu último desejo foi realizando, morrendo em sua fazenda Westport, ao lado da família e longe do hospital que tanto odiava.

Adeus Paul, o mundo (assim como este colunista) sentirá sua falta.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Sopa de Letras

Morre Machado de Assis, em 29 de setembro de 1908.

Muitos meninos, como meu irmão ou qualquer um que não goste muito de literatura luso-brasileira, não ligarão muito para essa data de 100 anos atrás, 11 anos depois da Fundação da Academia Brasileira de Letras. No entanto, o acontecimento não é relevante apenas pelo falecimento do presidente de uma congregação acadêmica tão influente no território nacional, não é importante por ele ter sido o autor do ambíguo Dom Casmurro, do irônico Quincas Borba ou do mórbido Memórias Póstumas de Brás Cubas. Esse acontecimento é importante por retomar uma trajetória de textos e de intelectuais que, de certa forma, são alguns dos orgulhos que o Brasil pode, realmente, exaltar.

Machado era jornalista. Talvez não fosse o modelo ideal de jornalista. Machado era funcionário público. Talvez fosse apenas mais um funcionário público que os brasileiros tiveram, enfiado na sujeira que são as práticas governamentais. Machado era um negro que subiu na vida, mais um pobre quase nobre. Machado é assunto de palestras, de aulas, de discussões, de imposições de leitura. No entanto, Machado não é apenas Machado. Pensando em futuro, Machado também é Guimarães Rosa e Drummond, escritores diferentes mas inspirados nele. Machado é escrita inteligente, é ter influências de Shakespeare para compôr um Dom Casmurro, ou falar da morbidez de Brás Cubas sem cair na depressão emocional de um Álvares de Azevedo, nem a promiscuidade extremada de um Lord Byron.

Machado é brasileiro. É inglês, é as modas francesas burguesinhas, é acadêmico, é vulgar, é sinestésico, é poético em prosa, é cultural em retalhos, é crítico, é misterioso e generoso em sua obra. Eu lançaria Machado como real representação do Brasil, e não a malandragem de Macunaíma, que apresenta apenas um aspecto nosso. Lançaria Machado de Assis e discutiria sobre seu feito histórico não porque a escola mandou, mas porque existe um mundo múltiplo em suas produções, que são vivas. É um mundo que pulsa, que não se vale por reduções nacionalistas ou ufanistas, ou mesmo por uma visão de mundo delimitadora.

"Ao vencedor, as batatas".

Personagem Quincas Borba, Memórias Póstumas de Brás Cubas.

(Frase encontrada no próprio livro Quincas Borba, também.)


Sopa de Letrinhas são crônicas (que deveriam ser) publicadas às quintas-feiras.

Falam de comunicação, de protesto e contra-protesto.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Pequeno Dicionário Estiloso

Porque a vida é complicada, mas a moda não precisa ser

Por Roxane Teixeira

Com o fim das liquidações de inverno, a moda primavera-verão 2009 já começa a aparecer nas vitrines. E se sairmos atrás de um novo par de sapatos, não haverá como fugir: vamos acabar com belas gladiadoras, que constroem um verdadeiro império nessa estação.

A sandália da vez, como o nome sugere, é inspirada nos calçados usados pelos gladiadores romanos; solas de couro presas aos pés por tiras, com proteção para a canela. Não é a primeira vez que ela ressurge; desde a Roma Antiga, o modelo teve inúmeras releituras, as mais famosas no auge dos anos 70, pois as rasteirinhas de couro combinavam muito com o espírito hippie da época.

Hoje, no entanto, o calçado chega com uma infinidade de variações, das casuais às super produzidas. O padrão sem salto ainda é o mais seguido, mas há sandálias em estilo gladiador com cara de festa: com saltos altíssimos, metalizadas, com aplicações de pedrarias, e até coloridas com textura croco (de couro de crocodilo, seja ele original ou imitação).

Outras diferenças ficam por conta do cano da sandália. Há canos bem rasos – os melhores para pernas grossas, pois evitam um volume maior nas canelas -, canos médios, mais parecidos com os originais dos soldados, e, para as mais ousadas, canos bem altos, que chegam até os joelhos. Nesse caso, é bom dar uma checada nas proporções. Mulheres baixas tendem a encolher mais com o modelo, e precisam de um saltinho, ou de um cano mais baixo. E mesmo as altas podem “achatar”, e devem evitar emendar o topo do calçado com a barra da saia; é preciso mostrar um pouquinho de pele.

Fechando o leque de opções, há a sandália gladiador com cara de bota, mais fechada. Aliás, quando o modelo arriscou sua reestréia, no verão europeu de 2007, houve certa divulgação da “sandália-bota ou gladiador”. Dois probleminhas aí: primeiro, não se trata do mesmo modelo. A sandália-bota, ou abotinada, leva esse nome por parecer com as ankle boots (botas de cano curto que terminam acima do calcanhar). Só não são consideradas botas pelos detalhes vazados, e por deixarem os dedos à mostra. E, segundo, convencionou-se usar “gladiadora”, ou em “estilo gladiador”, para não brigar com a gramática portuguesa, já que sandália é um substantivo feminino.

Agora, voltando ao X da questão, o modelo é, de fato, o mais explorado da estação. Grifes como Balenciaga, Lanvin e Dior lançaram suas versões – mas a moda anda mais democrática, e modelos mais acessíveis podem ser encontrados até em magazines. Para baratear ainda mais, pode-se trocar o couro por um sintético – o que vale a pena se for só para fazer graça.

E, para os homens ávidos por novidades fashion, a D&G e a Balenciaga lançam modelos masculino da gladiadora nessa estação. Vale arriscar, mas é preciso um cuidado extra. Canos altos e tiras na canela podem “atarracar” os homens que já têm pernas mais grossas, e as diversas presilhas podem puxar os pelinhos das pernas. Ui! Agora, se você ficar a cara do Brad Pitt em Tróia, pode desfilar à vontade.

Isso dito, escolha sua gladiadora – fiel escudeira desse verão – e ao ataque!

Dúvidas, críticas, sugestões? O que você quer ver na coluna? Comente, ou mande e-mail para o Bola da Foca. Nós queremos saber sua opinião!
Gladiadora da foto: Ramarin. Imagem retirada do Google Imagens

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Crime e Castigo de maneira descontraída

Zuenir Ventura faz três reportagens no Acre para cobrir a polêmica morte do ecologista e seringalista Chico Mendes e visualiza o mito e a realidade, tudo com bom humor e ética.

Por Pedro Zambarda de Araújo
2º ano de Jornalismo

Xapuri, para muitos do sudeste brasileiro, é um nome indígena sem um significado conhecido. Para o escritor carioca Zuenir Ventura, a cidade representa uma parte significativa de sua vida, que gerou um dos seus trabalhos mais premiados, tanto na literatura como jornalismo. Chico Mendes: Crime e Castigo traz as três grandes matérias e textos adicionais que Zuenir fez ao longo das investigações sobre a tragédia ocorrida entre o seringueiro e ecologista com fazendeiros locais.

A relação com Genésio Ferreira da Silva, que tinha apenas 14 anos em 1989, e foi um de seus primeiros entrevistados, mostra uma quase ligação de “pai e filho” entre eles. O fato do garoto ter vivido com Ventura até atingir a maioridade mostra como o repórter perdeu a imparcialidade com sua própria matéria. Essa relação adquiriu tamanha proporção pela participação do menino como testemunha-chave no processo de acusação durante a investigação dos principais suspeitos: Darly Alves da Silva e seu filho Darci. Dessa forma, o autor do livro se envolveu pessoalmente com o caso, denunciando os possíveis responsáveis pela morte do ícone político Chico Mendes.

Ventura conheceu de forma completa o Acre, tanto em Rio Branco quanto na cidade em que ocorreu o assassinato, Xapuri. Sobre a região, ele dizia, na época, que “da Amazônia só conhecia o mapa”. A responsabilidade de cobrir um acontecimento de repercussão nacional fez com que o repórter Zuenir Ventura se deparasse tanto com o mito Chico Mendes, o ecologista, quanto sua realidade menos ideal.

Entrevistas feitas com as esposas de Mendes, Ilzamar Mendes e Eunice Feitosa, mostram tanto a face de bigamia e machismo dos relacionamentos pessoais do seringueiro quanto a vergonha que Ventura sente ao expor as duas viúvas, em sua apuração jornalística.

Estruturando as reportagens da série O Acre de Chico Mendes, feitas para o Jornal do Brasil no começo da década de 1990, o autor as reorganizou com os nomes das mesmas divisões utilizadas no livro homônimo de Fiódor Dostoievski. Ao invés de tratar o caso linearmente, o autor dividiu o romance-reportagem em Introdução, Parte I: O Crime, Parte II: O Castigo e Parte III: Quinze Anos Depois.

Nessa última parte, além de colocar outros possíveis suspeitos na morte de Chico, como Oloci e Alvarino, também filhos de Darly (provavelmente co-autores com Darci), Zuenir mostra como o Acre se modernizou após a morte do ecologista, colocando muitas de suas idéias em prática, não para punir fazendeiros pecuaristas, mas para preservar o pouco que resta da amazônia, frente às constantes depredções do homem.

Mesmo tratando de assuntos densos como assassinato e julgamento, além da política regional, o autor não se mantém apenas em um vocabulário formal. Usando uma linguagem repleta de coloquialismos, Ventura cria apelidos como “Rambo” ao sargento da PM Honorato Neto, famoso por comandar o Esquadrão da Morte na cidade de Rio Branco. Ele também descreve o próprio réu Darly Alves da Silva como um homem de feições esqueléticas com uma espécie “caroço” no peito, que é, na verdade, uma úlcera inchada, e mais, que Darly também discorre, em suas falas, um discurso vazio, sem sentido para qualquer pessoa que o acuse. O suspeito é também cego de um dos olhos devido a um glaucoma e possuí óculos tão profundos quanto “o vidro de uma garrafa”, diz Zuenir. O autor ainda termina uma das descrições com a máxima “ele era um objeto mais de se observar do que de se ouvir”. A ironia é um recurso claro no texto da obra, especialmente nessa descrição.

É válido comentar, também, que Ventura compara os personagens entrevistados com atores de televisão e cinema, porque, na época de suas reportagens, estava sendo planejado um filme sobre Chico Mendes, chamado The burning season (Amazônia em Chamas), que foi produzido pela HBO, mas teve fraquíssima repercussão. Uma das comparações do livro é a atriz Sônia Braga, famosa por ser uma morena de feições mais robustas, com Ilzamar Mendes, igualmente resistente em seu estilo de vida (inicialmente submissa a Chico e, depois, destacando-se como viúva dele). Outra atriz vítima dos comentários do autor é Sigourney Weaver, para o papel da antropóloga Mary Allegretti, possuidora de uma personalidade feminina ousada, amiga pessoal de Chico Mendes e estudiosa sobre a situação do Acre.

Ao fim do livro, explica que, apesar do julgamento e das condenações de Darci e Darly a 19 anos de prisão, o caso permanece em aberto por outros possíveis autores, já citados nesse texto. Na verdade, Zuenir Ventura conclui que, mesmo a morte de Chico Mendes interessando a muitos políticos, a antipatia entre o seringueiro e o fazendeiro Alves da Silva tinha uma natureza mais pessoal, fruto das atitudes destemidas que Mendes tomou contra latifundiários. Por fim, seus seguidores, tanto na Fundação Chico Mendes liderada pela esposa Ilzamar, quanto em outras instituições, encamparam sua luta e suas virtudes pessoais para transformar o estado do Acre em um exemplo para o restante da Amazônia, e na luta por um desenvolvimento sustentável.

E Ventura, por sua vez, se encarrega de trazer essa forte história política sem tomar, explicitamente parte de nenhum dos lados. Apenas criticando e traduzindo a real importância desse episódio para a história da Amazônia e de nosso país.

sábado, 20 de setembro de 2008

Meirelles aproxima-se da perfeição

A exibição emocionou, até mesmo, José Saramago.

Sucesso nas livrarias, o romance Ensaio sobre a cegueira, do escritor português José Saramago, finalmente ganhou as telonas. A obra contou com a brilhante direção do cineasta brasileiro, Fernando Meirelles (Cidade de Deus e O jardineiro fiel). O filme reuniu um elenco de primeira e diferenciou-se das grandes produções por não ter nada de “hollywoodiano”.

A adaptação é parada, porém as belas atuações dos atores fazem o público se manter atento. O grande chamativo da filmagem é a representação da cegueira; Meirelles e sua equipe de fotografia acertaram em cheio ao abusar da luminosidade, retratando-a em telas brancas.

Sinal verde, trânsito movimentado na cidade grande, quando o caos da cegueira branca começa a se instalar. O primeiro cego (Yusuke Isseya) misteriosamente adquire essa característica. A doença toma a cidade e o caos começa a se instalar na metrópole fictícia.
Os afetados são enviados para uma espécie de sanatório, entrando no estado de quarentena, totalmente isolados do contato social. A mulher do médico, representada brilhantemente por Julianne Moore (O Fugitivo, Nove meses, Jurassic Park: O mundo perdido, Hanniball, entre outros), se mostra imune epidemia – ironicamente a especialidade médica do seu marido é a oftalmologia.

Moore representa uma mulher forte e batalhadora. Casada com o médico, representado por Mark Ruffalo (Brilho eterno de uma mente sem lembranças e Zodíaco), ela burla os enfermeiros fingindo-se de cega, passando a viver com os outros afetados. Ela é a testemunha ocular do horror, do sofrimento e da violência do local.

Presente na obra de Saramago, a desumanização da sociedade - regredida a uma forma primitiva e caótica - é trabalhada de uma forma fidedigna à escrita do português.

Muitos podem considerar a abordagem apelava, entretanto a fidelidade ao livro é clara, para delírio dos fãs da obra literária. Saramago critica diretamente o comportamento do homem em relação a dificuldade, ao defeito e a crítica; Meirelles reafirma isso com intensas seqüências poderosas, representando o maior caos que poderíamos imaginar. A lei e os valores são jogados no lixo, ou no chão como na obra: urina, fezes, roupas sujas e sangue decoram o “hospital”.

A tensão se instala de vez quando a lotação do lugar atinge o máximo, a cooperação e democracia inicial – principalmente na distribuição dos alimentos – é esquecida. Gael Gárcia Bernal (E sua mãe também, Babel e Diários de Motocicleta), como Rei da Ala 3, passa a liderar a distribuição da comida. O dinheiro e os objetos de valores acabam – devido ao isolamento social –e as exigências tornam-se cada vez piores. A moral e ética são destruídas, a sobrevivência está acima de tudo.

A produção conta com excelentes coadjuvantes. Danny Glover (Máquina Mortífera, Manderlay, Dream Girl e muitas outras obras), interpreta o Velho da venda preta, Alice Braga (Cidade de Deus, Cidade Baixa e Eu sou a lenda) comove como a mulher dos óculos ecuros. Prostituta de profissão, a personagem da brasileira adquire um aspecto maternal, criando laços afetivos com o Menino (Michell Nye).
O drama centraliza o colapso urbano, em que as relações humanas são exaltadas. O filme não merece apenas ser visto, e sim observado. Como adiantara o próprio Saramago, na epígrafe do livro-homônimo da adaptação: "Se é capaz de ver: olhe. Se é capaz de olhar: observe".

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Sopa de Letras

Richard Willian Wright morreu em uma segunda-feira, em um aniversário do álbum Wish You Were Here (lançado em 1975). da sua banda de maior sucesso, Pink Floyd. Rick morreu no último dia 15 no anonimato, com reservas da família e deixando fãs do rock com uma marca irreparável.

Eu sei, a grande maioria pode pensar que luto de admirador é um porre, um pé no saco. E com razão. No entanto, como dever jornalístico, literário e crônico, o assunto na verdade é uma ponte para outro, uma metáfora para muitos outros, uma enganação proposital e com recomendações.

Com sua morte, muito se lamentou e se falou sobre a possibilidade dos Pink Floyd se reunirem novamente. Ele, criador de verdadeiras "atmosferas", e não apenas improvisações no teclado, gerava o clima de união da banda, seja brigando com Roger Waters ou cantando com David Gilmour, ou mesmo se drogando. Com o concerto do Live 8, na Inglaterra, em 2005, os velhinhos tocando novamente parecia quase certo em ainda mais lugares. O câncer veio e levou Rick. Devemos ficar abalados por isso?

Até devemos.

Mas não podemos esquecer Wet Dream, de 1978, e Broken China, de 1996, que são trabalhos próprios nos teclados com conexões fora do rock, em arranjos jazzísticos e neoclássicos. Não podemos esquecer de Us and Them, Time e The Great Gig in the Sky, faixas do Dark Side of the Moon que são tão históricas quanto o próprio álbum. Não podemos esquecer das improvisações de Ummaguma, da inesquecível Summer ´68 de Atom Heart Mother e nem as performances ao vivo. O próprio The Wall, apesar dos teclados mínimos, teve um toque do seu trabalho.

Quando se fala em músicos, críticos e até amadores preferem ressaltar velocidade, preferem ressaltar a fama ou uma técnica que é inovadora momentâneamente. Rick não criou coisas completamente novas no teclado, exceto alguns efeitos, e nem sabia tocar na "velocidade da luz". Mas sabia conduzir notas que dialogavam com a voz, entorpeciam o corpo e alimentavam a alma. Não interessa somente a "morte do Pink Floyd" nessa semana, mas o sepultamento de um artista que nos conquista aparentemente como coadjuvante, quando ele guiava uma música bem própria.

Eu não lamento o fim dos Floyd nesse funeral, lamento não pode mais escutar a voz de Wright em Echoes. E pra quem não conhece, saiba que essa música, apesar de ser assinada pelos Pink Floyd, carrega na alma a técnica e o sentimento de um bom tecladista. Trata-se de uma música longa, com meia hora de duração, mas que guia os ouvintes aos maiores êxtases, principalmente na versão do DVD Live in Pompeii.

Sopa de Letrinhas são crônicas (que deveriam ser) publicadas às quintas-feiras.

Falam de comunicação, de protesto e contra-protesto.

Entrevistas com Manuel da Costa Pinto: Segunda Parte

Albert Camus: o jornalista e o homem atemporal

Por Pedro Zambarda de Araújo
Primeira entrevista: http://boladafoca.blogspot.com/2008/09/entrevistas-com-manuel-da-costa-pinto.html

Pedro: O que você acha de Camus ter feito carreira jornalística em um jornal como o Combat, durante a Segunda Guerra Mundial? Seria útil estudar o jornalismo dele nos dias de hoje?

MCP: Quanto ao Combat, foi um jornal publicado pela Resistência Francesa, sendo da época de um Camus saindo da Argélia miserável para morar na França. E, da mesma forma que ele formula uma idéia de absurdo que não está ligada a um período histórico específico, ele verifica a dimensão histórica desse absurdo. Há uma frase que ilustra isso em O Verão, “o homem não é totalmente culpado já que ele não inventou a história, nem é totalmente inocente porque a continua”. Ele vê na história a materialização de situações absurdas, que exigem participação ou engajamento, com a consciência que isso não elimina o absurdo, que é algo anterior a própria história. Dessa forma, o tempo de intervenção dele no Combat, assim como suas contribuições no L´Express, um outro jornal francês durante os anos 1950 e a Guerra da Argélia, será criadora de textos cuja responsabilidade política do intelectual se manifesta intensamente. Participando de jornais clandestinos, ele ajudava pessoas contra o regime nazista. Essa postura, no entanto, não esgota a luta política em si. Nesse aspecto, Albert Camus é muito diferente de outros escritores de sua época, que viam na literatura de ficção, na prosa em geral e na dramaturgia um caráter ideológico e pedagógico, engajado. Ele não era politizado nesse sentido, pois ele formula a idéia de absurdo em relação ao que é chamado de condição humana, termo do antigo humanismo do século XVI e XVII. Apesar da uniformidade do homem nesse conceito, Camus ainda consegue colocar que há manifestações específicas desse absurdo. Ele sempre oscila nesse universal e específico. Quando ele vai para o interior da Argélia e escreve uma verdadeira reportagem ao jornal Combat, ele denuncia as condições sub-humanas dos berberes, povo nômade do deserto. Isso dá o tom em seus artigos jornalísticos, que tratam de muitos assuntos específicos, como a Guerra da Argélia.

Pedro: E o ensaio, como se insere nesse processo?

MCP: O que migra do ensaio para seus textos de intervenção é o combate ao totalitarismo e às ideologias assassinas como imperativo categórico moral que deve ser seguido, mas sem transformar a história em um fim, um reino, em si mesma. Fazer isso, do ponto de vista dele, é justificar a própria história em sua plenitude. Seria justificar qualquer ação histórica, transformando o assassinato em regra porque, eventualmente, você estará do lado correto de quem é assassino ou é assassinado. Se você comete o “bom” assassinato, o assassinato revolucionário, você não é mais compelido a cometer esse radicalismo, mas o transforma em uma prática. Foi isso que ele visualizou no comunismo, estabelecendo uma linha de continuidade entre o nazismo e a própria doutrina comunista, sendo a principal questão de discordância em relação aos pensadores de esquerda. A história não esgota a nossa vivência com a realidade, que precede ela mesma. Portanto, ela não pode prever um desacordo entre o homem e seu mundo. O fato de ter uma atividade jornalística que denuncia e critica questões diversas, como injustiças financeiras e étnicas, não o coloca com postura de ideólogos tradicionais, mas coloca o próprio Camus em diálogo com suas duas percepções claras da realidade.

Pedro: Por que explorar Camus pelo ponto de vista dos moralistas franceses?

MCP: Pensar ele pelos moralistas redimensiona o pensamento dele em relação ao absurdo a luz de uma tradição de ceticismo moral e filosófico. Essa relação com Camus faz com que a filosofia não tenha idéias independentes do mundo, pois existe sempre uma dimensão concreta do pensamento. Você não generaliza mais, você não tem mais generalizações conceituais que são opressivas e impõem uma interpretação do mundo que respeite o homem concreto, o homem em sua variedade e precariedade. Nisso, os moralistas franceses ao trabalharem não mais com o conceito abstrato e universal, mas sim a notação do real em suas nuances, quase ficcionais, são mais realistas e respeitadores das descontinuidades do provisório que há no homem, irredutível a uma forma. Um dos problemas da metafísica é reduzir o homem a forma.

Pedro: Como funciona o mito solar na obra de Camus? Isso vale para os dias de hoje?

MCP: Essa dimensão solar em relação no mundo de hoje está na figura mítica do Sol, que permite pensar em valores e percepções atemporais fruto do encontro entre o homem e a realidade independente da história. E isso evita que se transforme a história em uma máquina que aliena. Nos tendemos hoje a pensar como seres sem sujeitos, historicamente. Isso, de hoje, é uma coisa que nem passava pela cabeça de Camus e dos existencialistas. Nós pensamos nas nossas determinações materiais, históricas e biológicas hoje em dia. O que Albert Camus jamais imaginou é que nós pudéssemos pensar nossa realidade como necessidades neurofisiológicas, como se tudo tivesse uma causa, uma materialidade ou alienação perante uma realidade. A “celebração dessa vivência solar” em Camus é um emblema ou símbolo de uma outra realidade onde se vive apartado dessas alienações, pois você vive irredutível a essas relações sociais que se impõem, o absurdo. Camus pensa o sol como emblema de gratuidade, de acaso. Estar aberto a essa gratuidade é viver relativizando aquilo que te determina, te condiciona.

Pedro: Manuel, muito obrigado pela entrevista. Assim que for possível, faremos outra, para abordar outros tópicos sobre Albert Camus.

MCP: Foi um prazer e estou à disposição.

Entrevista feita originalmente para monografia de iniciação científica no Centro Interdisiplinar de Pesquisa (CIP) da Faculdade Cásper Líbero.

Para mais informações: http://www.facasper.com.br/cip/

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Um paradoxo chamado Sarah Palin

Ela é ex-miss, conservadora, mãe de cinco filhos e governadora de um dos estados menos emblemáticos dos Estados Unidos. Ao mesmo tempo em que a candidata republicana à vice-presidência levanta a bandeira das questões moralizantes tão defendidas por seu partido, uma legião de mulheres se divide entre a admiração e a rejeição relacionadas à imagem da mulher que tomou o lugar de grandes nomes (masculinos) na posição de possível número dois do governo.

O eleitorado americano pode ser colocado - grosseiramente - em duas categorias: fãs do partido democrata, os quais atualmente buscam por mudanças, e conservadores protecionistas, que vêem nos republicanos a manutenção de seus ideias, muitas vezes apoiados em questões religiosas. Ao contrário do que acontece com John McCain, que atrai apenas a curiosidade dos democratas, Sarah Palin consegue algo a mais: o apoio de uma parcela do eleitorado que não se vê representada na figura de Barack Obama. Tal parcela é constituída majoritariamente pela mulher média, aquela que trabalha o dia todo, cuida dos filhos e ainda se vê na posição de se manter fiel a preceitos socias e religiosos. Para essas mulheres, ver uma "companheira de batente" chegar a um cargo como a vice-presidência mostra que é possível sim fazer um pouco de tudo,e, se você for mulher, fica ainda mais bonito com um batom.

De outro lado, será que para a mulher forte e capaz vale a pena ser representada por uma opositora aos gays, ao aborto e à educação sexual, postulados básicos do feminismo? É aí que está a questão. As "feministas de Palin" não se apropriaram do termo propriamente dito, mas sim o aprimoraram - segundo elas, para melhor. Com a conquista republicana, querem mostrar a Hilary Clinton, a qual teve 18 milhões de votos nas primárias democratas, que não é preciso se basear no sexismo para buscar a atenção feminina. Paradoxalmente, Palin se diz pronta para quebrar os estereótipos machistas que sempre impediram mulheres de alcançarem cargos elevados, manifestações já tão proclamadas por Hilary durante sua campanha.

Ao mesmo tempo em que o sentido do feminismo se confunde entre suas bases e um novo tipo mais conservador, as mais ferrenhas seguidoras do movimento alertam para as diferenças. Algumas mais radicais se apóiam no fato de que a filha mais velha de Palin, Bristol, de apenas 17 anos está grávida. Já Gloria Steinem, conhecida feminista seguidora de Clinton, publicou uma crítica feroz à candidata republicana no Los Angeles Times na qual afirmou que "a única coisa que Palin tem em comum com Hillary Clinton é um cromossomo". Segundo ela, a mulher que se diz protestar por direitos ou mesmo pela derrota de Clinton, não deve votar em McCain, salientando que "seria como dizer 'alguém roubou meus sapatos, por isso vou amputar minhas pernas'".

A idéia de uma mulher no poder é antiga, mas não deve ser dada a alguém apenas por isso. É preciso racionalizar e tentar encontrar o meio termo entre a busca pela igualdade de direitos e oportunidades e a competência para gerencias cargos importantes, sejam eles ocupados por homens ou mulheres. A decisão é dura: uma mãe tradicional ao lado de um republicano carimbado ao invés de um negro que estudou nas melhores universidades do país e um democrata mais contido? A escolha está nas mãos do povo americano, tanto representado por republicanos quanto por democratas, e cabe ao resto do mundo esperar até 4 de novembro para saber a resposta.

*Algumas informações foram retiradas do artigo "Sarah Palin encarna um novo feminismo, dizem eleitoras", do Jornal El País.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Entrevistas com Manuel da Costa Pinto: Primeira Parte

Albert Camus: autor universal e específico

Por Pedro Zambarda de Araújo

Autor de Albert Camus: um elogio ao ensaio, Manuel da Costa Pinto é jornalista da Folha de S.Paulo, além de trabalhar na TV Cultura. Destacando-se dentro da academia, escolheu abordar o ensaio nesse livro e mestrado sobre o escritor franco-argelino Albert Camus, dentro do Departamento de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP. A entrevista que se segue, feita no dia 2 de setembro, é um ponto de vista particular sobre a obra de Camus e um profundo estudo sobre as origens de sua escrita e pensamento.

Pedro: Começaremos uma entrevista aqui com Manuel da Costa Pinto, especialista na questão do ensaio em Albert Camus. Manuel, o que te levou a escolher Camus como tese de mestrado para ser publicada, posteriormente, em livro (Albert Camus: um elogio ao ensaio)? Como a carreira ensaísta de Albert Camus despertou curiosidade em você?

Manuel da Costa Pinto: Não fui ler Camus para fazer mestrado ou doutorado. Eu leio os livros dele desde os 15 anos de idade, mais ou menos. Fundamental foi uma leitura de Horácio Gonzalez, em um livro brevíssimo e muito agudo sobre uma obra de Albert Camus, a peça teatral Os Justos. Isso que me instigou mais a ler a obra do escritor franco-argelino, tanto ficcional quanto ensaística. Depois das leituras, Camus assumiu o posto de segundo escritor que eu mais gostava, apenas atrás do que mais admiro, Fiódor Dostoiévski. Por isso, meu projeto inicial no mestrado era fazer uma relação direta entre a obra de Albert Camus e Dostoiévski. O tema era muito específico. Camus era apenas um leitor da obra do russo, em suas citações no ensaio O Mito de Sísifo abordando o personagem Kirilov, de Os Demônios, além de outra menção no livro O Homem Revoltado ao Ivan Karamazov da tragédia Os Irmãos Karamazov. Ele também encenou uma adaptação da própria obra Os Demônios de Dostoiévski, uma peça chamada Os Possessos.

Pedro: Foi uma das poucas peças que ele atuou e dirigiu, certo?

MCP: É, e foi bem jovem que ele fez isso. Então, considerando que Albert Camus cita Dostoiévski em seus dois maiores ensaios, O Mito de Sísifo e O Homem Revoltado, a presença do russo é destaque. Além do que eu já disse, há também outra obra dele que é referencia direta a Dostoiévski, o monólogo crítico-reflexivo A Queda, cujo protagonista e cuja forma de narrar remetem a uma obra chamada Memória do Subsolo. Dessa forma, é interessante ver que ambos os escritores revelam uma dimensão ensaísta. Não pensaram o romance apenas como uma narrativa de trama, mas como um pensamento da realidade de seu tempo. Essa é uma característica do romance do século XIX que sobrevive com os existencialistas do século XX, embora Camus não fosse propriamente um existencialista. Escritores dessa geração, na França, fizeram uma prosa metafísica, reflexiva, especulativa e conceitual. Nesse contexto, a relação entre Dostoiévski e Camus muito me interessava para a pesquisa. Eu ia fazer uma tese sobre os dois, mas por sugestão de João Alexandre Barbosa, um dos maiores ensaístas brasileiros e amigo meu, falecido há dois anos, mudei a pesquisa para o gênero ensaio. Teve com foco o ensaio de tradição francesa, que é específica, vinda de autores como Montaigne e Chamfort, que são dos séculos XVII e XVIII e de uma tradição do pessimismo clássico, que se vale do emprego de aforismas ou aforismos, ou seja, fragmentos da anatomia da moral e dos costumes. Não por acaso, Jean-Paul Sartre em sua crítica ao romance O Estrangeiro insere Albert Camus exatamente nessa tradição de ensaístas. E eu achei muito rico isso, porque a idéia do romance de Camus acaba sendo reduzido a obras filosóficas. O estudo do ensaio me fez compreender que não é assim que se define a obra deles, porque eles não são filósofos que decidem escrever romances. Não é uma mera ilustração o ensaio, mas existe nele uma forma de pensar a realidade que é muito ligada à obra ficcional. É um ceticismo, sem usar o significado mais forte e radical do termo, que, dentro da reflexão moderna, deforma o mundo com caráter intencional. Na obra de Camus, está presente a idéia que toda a reflexão é, simultaneamente, uma invenção, ao contrário da fenomenologia forte em Sartre. De certa forma, é como se você tivesse um pé atrás nas concepções filosóficas e não aceitasse tudo como verdade, tendo uma espécie de relativismo principalmente considerando o imaginário por trás da idéia. Esse imaginário deforma a realidade.

Pedro: E como essa forma de pensar age em Albert Camus?

MCP: Essa perspectiva, no caso de Camus, está muito ligada a invenção ficcional dele. Então, o melhor exemplo nesse caso é quando Albert Camus fala sobre o conceito de absurdo nos textos, sobretudo O Mito de Sísifo que tem o subtítulo “o ensaio sobre o absurdo”. No entanto, qual é a melhor ilustração sobre o absurdo? Os melhores exemplos não são quando ele fala da “situação do homem diante de seu mundo”, mas estão nas representações ficcionais. Mersault (de O Estrangeiro), por exemplo, é um grande herói absurdo. Dessa forma, há uma comunicação incessante entre a ficção e o ensaio, um alimentando o outro. O romance tem origem na idéia primordial do absurdo, mas o próprio absurdo, formado conceitualmente, é baseado numa personagem literária. É um círculo que se alimenta reciprocamente e que me interessou muito. Camus torna o absurdo uma reflexão sobre a condição humana que depois se desdobra numa ética política, de conduta, em O Homem Revoltado.

Pedro: O que você fez, especificamente, nesse trabalho?

MCP: Eu procurei, nesse trabalho, fazer uma análise do ensaio como gênero literário. Não sou filósofo, portanto fiz em teoria literária. Meu trabalho foi sobre a singularidade presente no gênero ensaio. Uma coisa a ser levada em consideração é que a gente chama de o ensaio todo texto reflexivo e curto. Dessa forma, você pode considerar ensaio determinadas crônicas de jornal, como as que o Marcelo Coelho escreve na Folha. Casa Grande e Senzala de Gilberto Freyre ou Raízes do Brasil do Sérgio Buarque de Hollanda são ensaios de interpretação do Brasil. Sim, ensaio é isso e está correto. Ele é um gênero de reflexão que não é conceitual, nem técnico, é livre, mais pessoal. No entanto, generalizar o ensaio para qualquer gênero ficcional põe a perder a tradição ensaística que é francesa e específica. Ela que vem de Montaigne, passando por Camus e chega até um Roland Barthes, com uma reflexão moral e altamente literária. É prosa literária de não-ficção, segundo um crítico influente chamado Alexandre Eulálio. Uma prosa que é concentrada, mas que não inventa personagens. Apesar dessa definição, ela ainda não é suficiente para caracterizar a tradição francesa. No ceticismo de Montagne, por exemplo, há a falta de acesso ao mundo que enuncia, simultaneamente. De certa forma, esse ensaio específico anuncia a falência da filosofia pela incapacidade de apreender o mundo. O ensaísta percebe que o mundo é opaco e...

Pedro: Subjetivo?

MCP: É. O mundo é irredutível ao conceito. O que faz com que esse conceito não seja o conceito no sentido clássico do termo, mas sim uma invenção da realidade que você descreve, sem cair no relativismo total. Isso faz parte do jogo do ensaísta francês, tendo uma reflexão que pretende falar da realidade e mostra como ela é fugidia. O próprio movimento do ensaio em suas nuances mostra uma narrativa do “eu” diante da realidade, jamais apreensível. Por isso esse é o tema do meu livro, que é um livro sobre o gênero ensaio. Numa primeira parte, ele tenta definir a tradição ensaística e, num segundo momento, definir como Camus se insere nesse gênero, não sendo casual o fato dele ser, simultaneamente, um ensaísta e um ficcionista ao mesmo tempo.

Pedro: Você já respondeu muitas perguntas nessa resposta (risos). Quais outros pesquisadores sobre Camus você conhece na região de São Paulo ou até mesmo no Brasil?

MCP: Pesquisadores brasileiros? Além do Horácio Gonzalez, atual dono da Biblioteca Nacional de Buenos Aires, que, mesmo sendo argentino, escreveu aqui, no Brasil há pouquíssimas pessoas que escreveram sobre Camus. Há um belo trabalho comparando Vidas Secas de Graciliano Ramos com O Estrangeiro de um autor chamado Lorival Holanda.

Pedro: Por essa sua resposta eu gostaria de perguntar por que Albert Camus não tão lido? Você encontra motivos para não o ler aqui? Mesmo depois da Universidade Federal da Bahia ter encenado uma de suas peças, Calígula (em 1961), há motivo? Ele até mesmo viajou ao Brasil, conforme o livro Diário de Viagem, editado pela Record. Como explicar esse esquecimento dele?

MCP: É fato que toda essa geração de 1950-60, incluindo Camus, ficou muito marcada pelas questões políticas daquele momento. Isso marcou, sobretudo no caso dele na ruptura com Sartre, uma imagem de escritor idealista do ponto de vista político e ético, além de insuficiente para pensar a realidade pós-1970. Ele foi um pouco estigmatizado por não ser um escritor de esquerda, estigmatizado também por se encontrar numa posição delicada durante a Guerra da Argélia, mesmo sendo franco-argelino. Era um momento que “não ser de esquerda” significava ser de direita, que “não ser colonialista” significava “não ser francês” ou “não ser revoltado” significava ser contra os argelinos, uma posição de hesitação. Ele jamais via o povo francês como opressor, mas como formador da Argélia, mesmo sendo colônia. Ele era conciliatório. Hoje isso não é tão fácil de compreender, até mesmo porque são as esquerdas que são mais criticadas. Houve um momento da história ideológica da América Latina em que um escritor que não era alinhado a esquerda, não era um “companheiro de viagem dos comunistas”, era necessariamente um conservador. Esse fato não corresponde a verdade no caso de Camus, mas acabou prejudicando a recepção dele. Existe uma razão também de ordem filosófica, pois o existencialismo passou a ser encarado como uma “moda” em certo momento, o que é um equívoco, pois o Camus não é existencialista. Apesar dessa sucessão de equívocos, essas coisas acabaram obscurecendo a figura dele no cenário intelectual. Um terceiro elemento, que me parece o mais pertinente de todos, é que Albert Camus era um escritor clássico num certo sentido. Momento de mudanças drásticas no experimentalismo literário e estético, ele era um escritor que não correspondia a essa demanda ou expectativa de obra transgressiva. Ele era mais clássico e menos ousado do ponto de vista formal, principalmente na dramaturgia, por exemplo. Além disso, revelou-se nos anos 1960 e 1970 o noveau roman francês que trouxe autores experimentais, muito mais experimentais que os existencialistas, ou seja, que Camus e Sartre. Entre eles está Samuel Beckett, que era dramaturgo de origem irlandês, mas escrevia tanto em inglês quanto em francês. Dessa forma, os autores da década de 1950 foram vistos como menos inventivos. Apesar disso, ele foi um dos escritores mais enigmáticos da história da literatura francesa da primeira metade do século XX.

Pedro: E isso mudou?

MCP: Bom, mas é claro que esse julgamento estético estava muito enraizado pelo contexto político da época, fato que começou a ser revertido pelo fim da Guerra Fria nos anos 1980 e 1990. Essa nova configuração permitiu visualizar que Camus não era bem de direita, mas sim que era crítico quanto a história de maneira não ideológica. O fim das ideologias fez com que o estigma sobre Camus desaparecesse também. Ocorreu também uma redescoberta dele na revelação de um romance inacabado chamado O Primeiro Homem, cujos manuscritos foram encontrados no corpo dele após o acidente de carro com Gallimard, seu editor. Ambos faleceram, Camus com apenas 47 anos. Essa revisão da obra de Camus traz a tona, em certo momento, uma legibilidade que não significa pertencer ao realismo do século XIX, mas sim dos romances que não cabem em uma realidade e cujas várias dimensões incompreensíveis a deixa fragmentada. A realidade pede uma literatura que não seja uniforme ou linear. Apesar disso, esta linearidade está presente em Albert Camus, mas é perceptível uma certa inverossimilhança que está nas entrelinhas. Não é tão explícito quanto os autores do noveau roman, que rompem com o tempo e o espaço, mas está presente no que há de inverossímil na narrativa desenvolvida em Camus, com fatores “perturbadores” do verossímil em O Estrangeiro.

Pedro: Explique melhor.

MCP: O personagem Mersault, por exemplo, escreve na forma de diário, o que é incompatível com sua própria narrativa. É um narrador que, apesar de parecer, não é o convencional do realismo. Na verdade, ele escreve em um “não tempo”, num instante e o próprio romance se desenrola numa soma de acasos, soma de instantes presentes. Isso é inventivo do ponto de vista do romance. Dessa forma não é, explicitamente, experimental a primeira vista. Não por acaso, O Estrangeiro é a fonte do noveau roman, pelo menos segundo O Grau Zero da Escrita, de Roland Barthes. É um romance muito difícil de analisar nos dias de hoje, até porque ele é aparentemente uma obra de um personagem que tem uma psicologia, uma interioridade, e nada disso acontece. Se você for ler com um olhar mais apurado, você vai ver que o Mersault é como se fosse uma entidade mítica, que perambula pelas ruas de Argel naquela vida miúda e banal que tem uma dimensão trágica, chamada por Sartre de “tragédia solar”. Um dos artifícios mais interessantes que ele fez foi dar a uma vivência banal um ritmo e a alegoria de uma tragédia grega antiga. No caso de outro romance crônico de 1947, A Peste, ele narra como se fosse uma coluna jornalística, mas desdobrando os personagens em figuras simbólicas e muito alegóricas. Portanto, a prosa de Camus oscila entre o natural e o inverossímil, no sentido que não corresponde às categorias convencionais que temos – tempo, espaço, linearidade e compreensão. Ele faz isso porque atende, e isso eu acho interessante, não ao desejo de ser experimental ou alinhado a idéias estéticas, mas que obedece a realidade do absurdo. O absurdo, o gratuito, o incompreensível, torna equivalente todos os pontos de vista, com acontecimentos em seqüência que geram, simultaneamente, êxtase e morte.

Entrevista continua na segunda parte.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Pequeno Dicionário Estiloso

Porque a vida é complicada, mas a moda não precisa ser

Por Roxane Teixeira

Essa semana começa uma coluna de moda aqui no Bola da Foca, na tentativa de facilitar um pouco a vida de quem curte as novidades, mas não respira cada mudança do mundo fashion. Vamos decifrar os termos mais complicados, que sempre aparecem – sem definição - nas revistas especializadas. E vão rolar dicas de como adaptar o último grito para o dia-a-dia, para a mulher (ou o homem!) real. Espero que vocês gostem – e usem, sem medo, o que pintar por aqui!

A cada estação, a moda se reinventa; modelagens esquecidas ressurgem, e prometem invadir as ruas. Dessa vez, a vedete da turma é a calça sarouel, representante dos étnicos com perfume moderno. Mas o que é sarouel, e, mais importante, como combiná-la?

Pelo Dicionário de Moda, de Marco Sabino, o termo francês “sarouel” tem origem no árabe “sirwãl”, e define uma calça usada, inicialmente, no norte da África. O cavalo é bem mais baixo que o convencional, e a cintura é ajustada com uma amarração. Semelhante à sarongue indiana, uma peça de combate, que deveria favorecer a movimentação dos soldados, a sarouel surgiu como um modelo masculino. Mas as passarelas de Huis Clos, Maria Bonita Extra e tantas outras garantem que o modelo vai mesmo é invadir o guarda-roupa feminino no verão 2009.

Agora, com os grafismos e acessórios africanos em alta, a calça virou sinônimo de modernidade. E quem quiser ousar, pode apostar nas suas variações, mas com algum cuidado. O excesso de tecido produz um drapeado bacana, com caimento bonito – mas isso depende do tecido.

A sarouel com cara de alfaiataria tende a ficar linda no cabide – e péssima no corpo. O gancho baixo fica engomado, e parece um papo, um erro de costura. A saída é apelar para tecidos mais leves, mais molinhos. Se você não agüenta mais viscolycra e derivados, uma boa pedida é a viscose.

E, antes de montar a produção e desfilar por aí, veja a melhor opção para seu tipo físico. A calça é cheia de dobras na região do quadril, ou seja, pode disfarçar um dedinho de culote se o seu quadril for estreito, mas aumenta o volume da região se ele já for larguinho. As baixinhas também devem tomar cuidado com a sarouel: quanto mais baixo o cavalo, mais curtas as pernas parecerão.

E uma dica para todas é a da proporção: como a calça é muito volumosa, pede um complemento mais apagadinho. Uma blusa bem ajustada ao corpo equilibra a peça, e dá a chance de usar braceletes e colares étnicos, de corda, marfim, madeira... Atualíssimo. Agora, se quiser encarnar o espírito dos anos 70, combine com uma bata – desde que ela tenha um corte mais reto, e termine antes do quadril, para não brigar com a calça. Pronto! Você está preparada para a próxima estação - só faltando um belo par de sapatos. As mais altas podem usar uma rasteirinha cheia de estilo, e todas podemos combinar sarouel com uma sandália abotinada com salto. Fica lindo!

E, falando em sapatos, semana que vem eu volto com novidades para os seus pés...

Dúvidas, críticas, sugestões? O que você quer ver na coluna? Comente, ou mande e-mail para o Bola da Foca. Nós queremos saber sua opinião!
Sarouel da foto: 2TWO. Imagem retirada do Google Imagens

Morre Richard Wright, tecladista do Pink Floyd

O mundo da música está de luto. Morreu nesta segunda-feira Richard Wright, um dos fundadores do Pink Floyd. A notícia foi divulgada por um porta-voz do grupo. Rick Wright tinha 65 anos e sofria de câncer.

Richard Wright conheceu Nick Mason e Roger Waters na faculdade, e juntos formaram o grupo Sigma 6. Após um certo período, Syd Barrett entrou e se formou assim o Pink Floyd (após usarem vários nomes, inclusive The Megadeaths), com Mason na bateria, Waters no baixo, Barrett na guitarra e Wright nos teclados. Os integrantes dividiam o vocal entre si. Após um conturbado início, Syd Barrett foi afastado da banda devido a sérios problemas em relação ao álcool e as drogas, dando lugar ao ex-modelo David Gilmour.

Rick Wright acabou se tornando um grande parceiro de David Gimour, compondo boa parte das músicas dos Pink Floyd e muitas vezes entrando em conflito com o líder Roger Waters. Foi graças ao tecladista que a banda realizou duas das maiores músicas de todos os tempos no lendário “Dark Side of the Moon”, “Us and Them” e “The Great Gig in the Sky” que tem composição de teclados e voz feitas por Wright.

Sem dúvida, uma perda imensurável para o mundo da música, que vivia com a eterna expectativa de ver os quatro integrantes do Pink Floyd juntos, novamente.

A última vez que isso ocorreu foi no Live 8, em 2 de junho de 2005.

Cine na Cásper tem exibição polêmica amanhã

Filme mostra cenas exclusivas de "programas" da Xuxa com baixinhos!


Com o sucesso dos estudantes utilizando a sala do CAVH (Centro Acadêmico Vladmir Herzog) para exibições de filmes do circuito não-comercial, a cena se repete, isto é, o evento se repete amanhã, terça-feira (16). Os filmes são raros e o evento acontece em dois horários: às 11h30 e às 18h. O local é a sala dos estudantes, em frente à quadra, no 6º andar; a sala do Centro Acadêmico Vladmir Herzog, a única porta da faculdade que não é cinza, mas roxa!


Confira a programação:

Na Real do Real - 9 min
Sobre as famílias da favela Real Parque que perderam suas casas e tudo o que tinha dentro por causa de uma obra da prefeitura. – De Favela Atitude

Carnaval dos Baixinhos - 15 min
Mostra, criticamente, um pouco sobre a "rainha" Xuxa, seus filmes "eróticos" com crianças (com estas cenas exclusivas!) e o incêndio no seu programa.

Reciclando a Cultura do Lixo - 35 min
Conta a história de dois catadores de lixos recicláveis que tomam uma atitude inusitada para promover a cultura - De Averaldo Nunes e Márcio Mitio.

domingo, 14 de setembro de 2008

Domingos

Não é a primeira vez que planejo escrever algo sobre o Domingo. Apesar de ser vítima da inexorabilidade das convenções humanas – e do destino -, o Domingo está longe de ser uma Segunda-feira. O Domingo, em sua multipolaridade, causa em nós uma enorme influência, fazendo de nós reflexos de sua personalidade dominante no momento em que nasce.

Em muitas de minhas idas à locadora, aos Domingos – escrevo com “D” maiúsculo pois o Domingo é uma entidade poderosíssima e digna de certo respeito -, deixo que meus pés façam o caminho de ida e volta por conta própria, assim consigo reparar em certos detalhes esquecidos nos cantos também esquecidos de meu bairro.

Por pouquíssimos que sejam, temos aqui, na Vila Hamburguesa, alguns botecos. Uns mais arrumados que outros, mais apresentáveis, mas ainda assim botecos. E o que seria dos botecos sem os bêbados? Eu lhes digo: seria um Domingo. Não sei se pela força desse dia que abate a todos como a bois no matadouro ou se pelo simples fato de, no Domingo, o ócio ter uma força maior. Deixo aberta a questão.

No meu caminho, desviando com o peito apertado das poças de água na calçada recém lavada de chuva, passo na frente de um desses botecos. Não são bêbados que estão lá, mas pessoas que, na minha mentalidade, passam a semana engravatados em um ir-e-vir nas marginais e avenidas de São Paulo. Mas, afinal de contas, também são merecedores.

Essas pessoas, nesse boteco, desafiavam o frio com mais uma rodada de chopes. É dia de futebol, é dia de bar, é dia de chope, tudo isso junto, em conseqüência, transforma o Domingo em um dia para procrastinar os medos e a tão inevitável Segunda-feira. Digo a mim mesmo que são merecedores dessa paz também. Ninguém deveria se preocupar aos Domingos.

Vejo, além dos bares, os motoristas de ônibus, dividindo sua atenção entre o trânsito e a ansiedade do retorno ao lar, do encontro com a família, com o chope, com os comentários do futebol, já que o desencontro entre eles foi inevitável devido a essa terrível e honrosa tarefa de levar as pessoas nos Domingos.

No caminho, barbearias fechadas, farmácias vazias, um som de alguém tocando piano no fundo da sala de uma casa que tem a porta aberta; Carros, ônibus e gritos cortam o silêncio denso que existe entre as árvores, plantadas simetricamente, disfarçando o acúmulo de prédios; Um bom número de pessoas caminhando, voltando para casa ou indo para a casa de alguém que não a própria, vagando sem rumo, sem pensar. E eu termino meu Domingo em casa, relembrando tudo e fazendo um juramento: serei eu, no próximo Domingo, o alvo de uma crônica carregada de inveja de mim. Mas inveja boa, de querer bem.

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Um metrô de problemas


Segundo a Companhia do Metropolitano de São Paulo, o Metrô, cerca de dois milhões e meio de pessoas utilizam, diariamente, o transporte como meio de locomoção. Embora seja, segundo indicadores do Movimento Nossa São Paulo hoje, a terceira opção de locomoção do paulistano (perdendo apenas para o automóvel e ônibus), o sistema metroviário é o quinto em extensão, depois dos ônibus convencionais, corredores de ônibus, trólebus e trem. Os 60 km de trilhos distribuídos em quatro linhas (Azul, Verde, Vermelha e Lilás) e divididas em 55 estações não suprem a necessidade da população da cidade de São Paulo, estimada, segundo Censo 2000, em mais de dez milhões de habitantes. A expansão do metrô não acompanhou o crescimento da cidade. E, andando em ritmo lento, os paulistanos tentam descobrir de quem é a culpa.

Trens lotados, lentos e insuficientes. Passageiros descontentes e frustrados. Essa situação de caos tornou-se rotina em São Paulo, desde que o sistema metroviário fora implantado em 1974. Mas a decisão que mudaria para sempre a cara da capital paulista ocorrera seis anos antes, quando, no dia 24 de abril de 1968, foi criada a Companhia do Metropolitano de São Paulo, o Metrô. A iniciativa partiu da necessidade de se descongestionar o trânsito da cidade, que, desde a década de 1940, vinha se tornando cada vez mais caótico. A desativação dos bondes, o aumento da frota de ônibus, a decadência do sistema ferroviário, o desenvolvimento da indústria automotiva nacional, são os principais fatores que contribuíram para o aumento do número de veículos nas ruas da cidade.

O início das obras naquele mesmo ano dava a São Paulo uma imagem de tecnologia e progresso. Quando, em 1974, parte da futura Linha 1-Azul foi inaugurada (na ocasião, apenas o trecho Jabaquara – Vila Mariana entrou em operação), a maior cidade do país considerou-se inserida num momento de forte desenvolvimento. O jornalista, historiador e ex-assessor do Metrô, Assis Ângelo, diz que “foi realmente fantástico. Aliás, até hoje, cada inauguração de uma estação é motivo de orgulho para a cidade de São Paulo. Você imagina o que isso representou em 1974”, rememora.

Primeira estação: o problema

É comum pensar que a responsabilidade por esse caos subterrâneo seja do governo. No entanto, é difícil identificar o real detentor do problema quando, na verdade, ele pertence aos três níveis de poder – municipal, estadual, e federal. “O metrô nasceu com o Município, o Estado e União têm uma participação pequena. No entanto, o governo federal não deveria se ausentar, a prefeitura menos ainda e ela se ausentou. Tem-se que adquirir a convicção de que as três esferas do poder são responsáveis”, afirma Adriano Branco, ex-secretário estadual de transportes de São Paulo entre os anos de 84 e 87 que, hoje, atua em consultoria de trânsito.

Segundo Branco, de início o município foi mentor do metrô. No entanto, a prefeitura foi ficando com recursos escassos e se associou ao Estado que assumiu o controle acionário do transporte. O governo Federal também assumiu algumas ações, poucas, segundo Branco. Para ele, o motivo principal do metrô andar em marcha lenta é a falta de articulação entre essas esferas políticas. “Há certa antipatia caso haja uma disputa política entre União e Estado, quando são de partidos diferentes. Por outro lado, não ajuda muito se os partidos coincidirem. Não adianta nada. Eu vi o governador Alckmin pedir audiência ao FHC, por exemplo, para tratar da questão dos Portos e ele não o atendeu”, relata Branco ao afirmar que a questão política não é o que mais influencia no bom andamento do metrô. Assim concorda Marco Antonio Carvalho Teixeira, pesquisador de Gestão Pública e Cidadania da FGV. Para ele, o problema do metrô é estrutural e que alinhamento político influencia sim, mas esse fator não é o principal.

A própria fundação desse transporte, em 1968, não envolveu problemas de natureza política. “Naquela ocasião, o presidente da Companhia do Metropolitano de São Paulo e outras estatais do Brasil inteiro, naturalmente, eram escolhidas pelas forças políticas que vigoravam. Portanto, pela força militar. Então, não existia uma briga política propriamente dita, porque tudo se acertava nos bastidores das cavernas”, afirma Assis Ângelo. Verdade seja dita, o regime autoritário encobria a existência de intrigas entre os vários níveis de governo. Mas o problema encontrado não era de natureza política. Segundo Célia Baider Stéfani, doutora em Geografia Humana, que apresentou ao Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências da Universidade de São Paulo uma tese de mestrado relativo ao sistema ferroviário paulista, “o empecilho maior era econômico e não político”.

Segunda estação: o dinheiro

O problema quanto à origem de verbas para a construção de novas estações e linhas vem se arrastando desde a fundação do GEM, Grupo Executivo Metropolitano (antecessor do Metrô). Criado pelo Conselho Metropolitano de Desenvolvimento, em 1966, na gestão do prefeito José Vicente Faria Lima, cuja finalidade era definir projetos. Dificuldades relativas à obtenção de financiamento das obras levaram o seu sucessor, Paulo Maluf, a desacelerar o ritmo dos trabalhos, privilegiando outras obras viárias. “A preocupação maior dos governos a partir da implantação do metrô foi de alicerçar obras para o transporte particular e não público”, afirma Célia.

“O metrô e a própria CPTM são duas empresas importantes, mas são órfãs de pai e mãe. Os recursos são do tesouro do Estado, nada de significativo advém da União”, afirma Branco. Para ele, uma das soluções para se obter verbas seria a chamada Concessão Urbanística. Esse dispositivo permite ao Poder Executivo, mediante licitação, delegar à iniciativa privada a realização de obras de urbanização. Com a valorização dos terrenos provocada pelos projetos de implantação do metrô, é possível que o Estado negocie contratos mais lucrativos, ou seja, pode-se investir no transporte com os lucros obtidos da especulação imobiliária sobre os contratos de Concessão Urbanística. Além disso, há ainda a possibilidade de conceder a própria Companhia do Metropolitano de São Paulo a uma empresa privada. Segundo Branco, 73% da receita do metrô de Tóquio advém de negócios imobiliários.

O desembarque
Como medida para atacar o problema, o ex-secretário sugere estabelecer prioridades e pôr na ordem do dia a modernização da CPTM. “A região metropolitana tem 280 km de trem, dos quais 160 estão na capital, enquanto o metrô tem 60. O custo é menor”. O metrô entraria logo depois com a ampliação das linhas apoiadas pela iniciativa privada.

Apesar das possíveis soluções, Branco não se mostra otimista quanto ao desfecho deste problema, pois não vislumbra solução. “Hoje eu digo, seguramente, que a cidade de São Paulo já está parada. Eu acho que estamos indo para uma situação mais grave, para a fase da revolta. Isso é muito mais que um embate político”, constata Branco e os mais de dois milhões de usuários do metrô.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

1602

A primeira obra de Neil Gaiman para a Marvel

O que fazer para criar um novo clássico dos quadrinhos? Como, no começo século XXI, criar algo para ser lembrado por décadas, justamente em uma época que vivemos de rever clássicos oitentistas? Foi essa a pergunta que Joe Quesada se fez no início dos anos 2000, quando se tornou editor-chefe da Marvel. A resposta para tal pergunta foi a contratação de um nome inquestionável no meio, algo que deixaria o mercado de histórias em quadrinhos em êxtase. E foi o que Quesada fez, contratando simplesmente um dos nomes mais conceituados da história para escrever para a Marvel: Neil Gaiman.

Já fazia algum tempo que o criador de Sandman vinha sendo cortejado pelas grandes editoras. Embora Neil Gaiman tenha tido uma longa parceria com a DC Comics, seus trabalhos foram sempre foram para o selo adulto da editora, a Vertigo. Suas obras para os principais personagens das grandes editoras foram aclamadas participações especiais em pequenos contos ou edições de luxo de 60 páginas. Nunca algo realmente grande, e mais importante, nunca algo para a Marvel. E Joe Quesada, sabendo disso, contratou Gaiman a peso de ouro, dando carta branca ao escritor para brincar a vontade com o universo Marvel, além de ter uma ampla opção de artistas com quem trabalhar. E Gaiman abusou de tal liberdade.

Com todos os personagens da Marvel a sua disposição e sem ninguém vigiando de perto seu trabalho, Neil Gaiman recriou o universo da editora de forma inovadora, situando tudo 4 séculos antes, no ano de 1602, título da obra. A premissa assustou muitos fãs quando foi revelada, alguns até disseram que Gaiman havia enlouquecido, mas o tempo lhe deu crédito. Com um enredo situado na Inglaterra do começo do século XVII, o chefe da agência da espionagem SHIELD, Nick Fury, se torna Sir Nicholas Fury, chefe de espionagem da rainha Elizabeth I. Com a ajuda do médico real Stephen Strange (Dr. Estranho nos quadrinhos) Fury tenta desvendar estranhos acontecimentos que vêm causando o pânico na população, que teme o fim do mundo. Qualquer revelação além desta básica premissa estragará a intrincada história criada por Neil Gaiman. Grande parte do repertório da Marvel é usado, mas, surpreendentemente,sem se prender às grandes marcas. Heróis famosos como Hulk, Homem de Ferro e Wolverine foram deixados de fora, enquanto a grande marca da Marvel, o Homem Aranha, foi renegado a um simples papel de coadjuvante, com Peter Parker (Peter Parquasch na história) como um adolescente sem poderes e ajudante de Fury.

No entanto o uso de outros personagens consagrados pelos fãs, apenas lembrados por parcela do público ou até mesmo esquecidos mostram a grande força de 1602. Matt Murdoch se torna a própria essência do Demolidor, encarnando um agente mercenário de Nicholas Fury que se torna uma lenda por matar sem ser visto e pela suposta ausência de medo. O Quarteto Fantástico ganha especial destaque após a segunda metade da HQ, nos mostrando um Dr. Reed Richards fascinante, como há anos não se via. O X-Men e Charles Xavier, com nomes alterados, mas ainda reconhecíveis, tiveram seu grupo diminuído para a apenas 6 jovens, e sem o já citado Wolverine. No entanto Cyclope, Anjo e Jean Gray ganham especial destaque, com uma subtrama curta, porém fascinante. E ainda surge a figura de Thor, personagem muito popular nos EUA, mas que não conseguiu muita receptividade por aqui. Ainda como antagonista surge a figura do Dr.Otto von Doom, eterno vilão nas histórias do Quarteto Fantástico, ocupando toda a primeira metade da história como um rival imponente, mesmo com a presença discreta, mas ameaçadora, de Magneto encarnando um alto sacerdote da inquisição. Fechando o ciclo de personagens principais, Gaiman exercita novamente seu talento ao criar Virginia e Roszjhas, uma garota e um índio vindos da América para uma audiência com a rainha Elizabeth. É sobre a garota que cai a suspeita de ser a causadora dos estranhos eventos. Neil Gaiman os cria a partir do zero e consegue de forma magistral integrá-los a um universo de personagens que já são atraentes em essência.

Mas Neil Gaiman se supera mesmo na mistura de história real com ficção. 1602 foi um complicado ano para a Inglaterra, que vivia o fim do reinado absolutista de Elizabeth I e a falta de um herdeiro deixava todos apreensivos. Além de Virginia, personagem que de fato existiu, Gaiman, como bom inglês que é, trabalha a figura de James IV, rei da Escócia que assume o trono com a morte de Elizabeth. Criando um vilão de caráter e inteligência fracos, mas com grande poder, Neil Gaiman transfere para o ano de 1602 toda a paranóia americana do século XXI. Embora não seja exagerado demais fazer tais comparações com qualquer obra criada nos dias de hoje, é impossível não lembrar das hostilidades aos árabes nos EUA pós- 11 de setembro lendo a segunda metade da obra.

Se a própria história de 1602 já não sustentasse sozinha uma grande HQ, pode-se dizer que Neil Gaiman acertou em cheio ao escolher o desconhecido Andy Kubert para desenhar a trama. Andy Kubert exercita aquilo que se costumou chamar de traço americano clássico, sendo extremamente detalhista em closes e mais rebuscado em quadros distantes. É uma forma de transmitir realismo, mas sem perder certa liberdade de criação. Tal escolha pode ser considerada uma surpresa, já que Gaiman ficou famoso por trabalhar com artistas de traços mais abstrato e rebuscado em Sandman e Violent Cases, no entanto percebe-se que tais traços não combinariam com o estilo de época empregado em 1602. Com uma capa que ressuscita a famosa foto dos conspiradores de Guy Fawkes, Kubert se mostra essencial na compreensão da trama, chegando a arrancar de Neil Gaiman o comentário de que “se tornara irrelevante perante o trabalho de Andy”. Embora todos os personagens tenham sido trazidos de forma crível ao visual de 1602, com roupas de época e sem qualquer tipo de exagero, a construção de Nicholas Fury, Stephen Strange e Otto Von Doom saltam aos olhos.

Todas as cenas de ação são feitas com maestria, especialmente uma seqüência de quadros que retratam em slow motion movimentos de Mathew Murdoch. Este inclusive é o grande talento de Kubert em 1602, criar uma sensação constante de movimento em uma HQ com ritmo crescente, sem em nenhum momento se perder na grande quantidade de personagens presentes, muitas vezes no mesmo quadro. Mas o momento de genialidade se revela mesmo na utilização de gráficos antigos, remetentes aos quadrinhos da década de 40, no momento de recriar a história de determinado personagem.

Quando Neil Gaiman anunciou que escreveria sua primeira história para a Marvel muita expectativa foi criada, e o autor inglês mostrou novamente que não costuma desapontar fãs e críticos. Com uma história supostamente despretensiosa, mas ao mesmo tempo revolucionária (por mais contraditório que isso pareça), Neil Gaiman deu um novo fôlego às minisséries da Marvel. Com o álbum encadernado que chega ao Brasil pela Panini, pode-se ter noção, sem qualquer tipo de interrupção, a grandiosidade que o trabalho alcança. A edição ainda vem acompanhada de um prefácio escrito pelo próprio Neil Gaiman, um making-of com artes iniciais e uma reprodução das cartas entre Neil e Andy. Enfim, uma oportunidade imperdível de ler a única produção criada pelo escritor mais celebrado dos quadrinhos na atualidade para a Marvel.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Fique com ele


Hook me Up, do The Veronicas, é um senhor avanço em relação ao primeiro álbum

Por Roxane Teixeira

Os australianos do The Veronicas chegam com um álbum bem diferente do antecessor The Secret Life of, de 2005. A banda deixou de lado o estilo pop adolescente, e agora se aventura na mistura de rock com uma forte pegada eletrônica, que é a chave de Hook me Up (em tradução livre, “Fique Comigo”).

Sob o comando de Josh Alexander – o produtor responsável pelo amadurecimento percebido nas músicas de Jojo – os arranjos aparecem mais elaborados, e seguem a tendência atual de fundir techno, rap e rock. Essa calibrada no time de produtores, aliada à troca de gravadora (da Warner para a Sire) parece ter feito muito bem às irmãs Origliasso, que se esmeram em vocais mais trabalhados que os do primeiro álbum.

Nas canções Untouched, This Is How It Feels e Popular, fica clara a melhora na afinação das meninas, puxando para o estilo de Pink, principalmente nos gritos mais poderosos e nos trechos falados, com jeito de rap. Mas o que sobressai em todas as faixas é o charme do eletrônico, feito aos moldes da turma de classe do gênero: Gnarls Barkley, Spektrum e Mark Ronson. Dá para tocar Hook me Up na pista de dança para curtir a batida e a vocalização eletrônica, ou deixar rolando bem alto no MP3-player.

E para quem está preocupado com a perda da tendência rock 'n' roll, sutilmente traçada no primeiro álbum, dessa vez a banda deixa o som mais pesado; as baladas românticas são puro soft-rock, e a canção In Another Life é boa discípula da famosa Every Rose Has it’s Thorn, do Poison.

O único tropeço do disco fica por conta das letras, pobres, e com refrões que, em geral, são mera repetição do título. Outro lapso é, curiosamente, a canção homônima ao álbum. Hook me Up, primeiro single lançado, tem refrão fraco, nenhuma novidade vocal, e pouca intervenção eletrônica no pop com cara de antigo – sem surpresa, é uma das piorzinhas do CD. Agora, se a sua única preocupação é não se preocupar, e pular feito um doido na balada ou no chuveiro, Hook me Up, com suas misturas inusitadas, é uma ótima pedida.

domingo, 7 de setembro de 2008

Independência E Morte

Às margens do Ipiranga foi escrito o óbito do Brasil, o óbito brasileiro. No discurso monarquista, no discurso republicano, na ditadura profana e nessa porca democracia estão o sepultamento implícito, a tragédia explícita.

Das reclamações do bar até os castos discursos repúblicanos, essa ideologia que me causa repugnância revira meu estômago recheado pela feijoada domingueira e pela frustração da ausência de um feriado semanal, pela ausência de um dia que me entorpece. As costeletas peludas de Dom Pedro I boiavam no caldo que embalsamava e irrigava o feijão preto. Essas costeletas peludas que não diferem da barba messiânica do filho e nem do terno italiano do Maluf Salim, nem dessas personalidades pseudo-africanas, desses amantes-do-marfim. Amantes da África Brasileira que ouviram no Ipiranga, às margens turvas.

Então, quando as aulas de segunda-feira no pré-primário iniciarem, provavelmente estamparão um quadro de Pedro Américo e um discurso homérico. Enquanto o script é cumprido, enquanto o pobre está faminto e o pseudo-rico preocupado lhe cede esmola, o calor brasileiro embolora a bandeira rasgada na lata de lixo, nesse país do bicho.

sábado, 6 de setembro de 2008

Epicure-se

Prazer, do latim placere, indica um ato de satisfação pessoal, seja ela sensível ou lasciva. A eterna busca pelo prazer gera questões onde conceitos básicos são discutidos, com o intuito de se descobrir o quão válida essa procura pode ser. Existem limites? As expectativas alcançam o ato em si? Ou viver por um momento gera tamanha excitação ao ponto de um indivíduo se frustrar? É preciso encontrar essas respostas para que, enfim, possamos existir como um todo, respeitando as barreiras e, principalmente, a nós mesmos.

Hedonismo e exagero entram na lista de substantivos presentes na vida cotidiana. O consumismo acelerado, dispensável e sem sentido é encontrado a cada esquina, nas sacolas seguradas por pessoas já demarcadas por este vício. Cegas pela alienação, entregam-se a futilidades e deixam-se levar por propagandas enganosas, acreditando que, assim, são pessoas felizes. Um prazer muitas vezes culposo, mas já irrefutável na sociedade.

A admiração pelo corpo e seus sentidos vem de longa data. Gregos e romanos viviam em uma organização invejável, mas que escondia atitudes regadas ao sexo casual e negligente. Em paradoxo vem a Idade Média, onde o medo e o pecado habitavam as pessoas, as quais se prendiam a um celibato mental onde tudo era considerado proibido e indigno de Deus. Já no mundo contemporâneo, onde a hipocrisia e a negação são particularidades de muitos, a censura persiste oculta, a partir do momento em que o corpo passa a ser visto como um aglomerado de impurezas.

A consumação do ato sexual pode demorar anos, mesmo entre aqueles que já se arriscam em preliminares mais do que excitantes. Guardar-se para o parceiro adequado envolve forte determinação, assim como a espera pelo momento. Chico Buarque já pregava a filosofia do “tô me guardando pra quando o carnaval chegar”, deixando bem claro o adiamento de uma vontade tão reprimida.

Decidir pela castidade ou não depende apenas do psicológico pessoal, podendo levar em conta argumentos sociais e religiosos. A definição da escolha e do prazer não deve ser vista como pecado, mas sim como um auto conhecimento literal e construtivo. Se conscientizar e prevenir são rituais diários, que devem ser vistos como fortificação para um epicurismo sadio, responsável e, acima de tudo, proveitoso.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Marca de preservativos promove Dia do Sexo


Em uma campanha publicitária durante os meses de junho, julho, agosto e setembro, a empresa de camisinhas Olla promoveu manifestações de celebridades como a VJ Penélope da MTV, a banda Engenheiros do Havaii e pessoas comuns em pontos diversos de São Paulo para a legalização de um novo feriado nacional: O Dia do Sexo. Sob o slogan "Dia das Mães, Dia dos Pais, Dia das Crianças, Dia dos Namorados. Em meio a tantas datas comemorativas no nosso calendário oficial, por que não criamos um dia em homenagem àquilo que deu origem a tudo: o sexo?", a campanha tem feito adeptos por petições online em seu site na internet, além de estimular o consumo de camisinhas para "comemorar" o dia.

A proposta de feriado é dia 6 de setembro, na véspera da Dia Independência Nacional.


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