Albert Camus: o jornalista e o homem atemporal
Por Pedro Zambarda de Araújo
Primeira entrevista: http://boladafoca.blogspot.com/2008/09/entrevistas-com-manuel-da-costa-pinto.html
Pedro: O que você acha de Camus ter feito carreira jornalística em um jornal como o Combat, durante a Segunda Guerra Mundial? Seria útil estudar o jornalismo dele nos dias de hoje?
MCP: Quanto ao Combat, foi um jornal publicado pela Resistência Francesa, sendo da época de um Camus saindo da Argélia miserável para morar na França. E, da mesma forma que ele formula uma idéia de absurdo que não está ligada a um período histórico específico, ele verifica a dimensão histórica desse absurdo. Há uma frase que ilustra isso em O Verão, “o homem não é totalmente culpado já que ele não inventou a história, nem é totalmente inocente porque a continua”. Ele vê na história a materialização de situações absurdas, que exigem participação ou engajamento, com a consciência que isso não elimina o absurdo, que é algo anterior a própria história. Dessa forma, o tempo de intervenção dele no Combat, assim como suas contribuições no L´Express, um outro jornal francês durante os anos 1950 e a Guerra da Argélia, será criadora de textos cuja responsabilidade política do intelectual se manifesta intensamente. Participando de jornais clandestinos, ele ajudava pessoas contra o regime nazista. Essa postura, no entanto, não esgota a luta política em si. Nesse aspecto, Albert Camus é muito diferente de outros escritores de sua época, que viam na literatura de ficção, na prosa em geral e na dramaturgia um caráter ideológico e pedagógico, engajado. Ele não era politizado nesse sentido, pois ele formula a idéia de absurdo em relação ao que é chamado de condição humana, termo do antigo humanismo do século XVI e XVII. Apesar da uniformidade do homem nesse conceito, Camus ainda consegue colocar que há manifestações específicas desse absurdo. Ele sempre oscila nesse universal e específico. Quando ele vai para o interior da Argélia e escreve uma verdadeira reportagem ao jornal Combat, ele denuncia as condições sub-humanas dos berberes, povo nômade do deserto. Isso dá o tom em seus artigos jornalísticos, que tratam de muitos assuntos específicos, como a Guerra da Argélia.
Pedro: E o ensaio, como se insere nesse processo?
MCP: O que migra do ensaio para seus textos de intervenção é o combate ao totalitarismo e às ideologias assassinas como imperativo categórico moral que deve ser seguido, mas sem transformar a história em um fim, um reino, em si mesma. Fazer isso, do ponto de vista dele, é justificar a própria história em sua plenitude. Seria justificar qualquer ação histórica, transformando o assassinato em regra porque, eventualmente, você estará do lado correto de quem é assassino ou é assassinado. Se você comete o “bom” assassinato, o assassinato revolucionário, você não é mais compelido a cometer esse radicalismo, mas o transforma em uma prática. Foi isso que ele visualizou no comunismo, estabelecendo uma linha de continuidade entre o nazismo e a própria doutrina comunista, sendo a principal questão de discordância em relação aos pensadores de esquerda. A história não esgota a nossa vivência com a realidade, que precede ela mesma. Portanto, ela não pode prever um desacordo entre o homem e seu mundo. O fato de ter uma atividade jornalística que denuncia e critica questões diversas, como injustiças financeiras e étnicas, não o coloca com postura de ideólogos tradicionais, mas coloca o próprio Camus em diálogo com suas duas percepções claras da realidade.
Pedro: Por que explorar Camus pelo ponto de vista dos moralistas franceses?
MCP: Pensar ele pelos moralistas redimensiona o pensamento dele em relação ao absurdo a luz de uma tradição de ceticismo moral e filosófico. Essa relação com Camus faz com que a filosofia não tenha idéias independentes do mundo, pois existe sempre uma dimensão concreta do pensamento. Você não generaliza mais, você não tem mais generalizações conceituais que são opressivas e impõem uma interpretação do mundo que respeite o homem concreto, o homem em sua variedade e precariedade. Nisso, os moralistas franceses ao trabalharem não mais com o conceito abstrato e universal, mas sim a notação do real em suas nuances, quase ficcionais, são mais realistas e respeitadores das descontinuidades do provisório que há no homem, irredutível a uma forma. Um dos problemas da metafísica é reduzir o homem a forma.
Pedro: Como funciona o mito solar na obra de Camus? Isso vale para os dias de hoje?
MCP: Essa dimensão solar em relação no mundo de hoje está na figura mítica do Sol, que permite pensar em valores e percepções atemporais fruto do encontro entre o homem e a realidade independente da história. E isso evita que se transforme a história em uma máquina que aliena. Nos tendemos hoje a pensar como seres sem sujeitos, historicamente. Isso, de hoje, é uma coisa que nem passava pela cabeça de Camus e dos existencialistas. Nós pensamos nas nossas determinações materiais, históricas e biológicas hoje em dia. O que Albert Camus jamais imaginou é que nós pudéssemos pensar nossa realidade como necessidades neurofisiológicas, como se tudo tivesse uma causa, uma materialidade ou alienação perante uma realidade. A “celebração dessa vivência solar” em Camus é um emblema ou símbolo de uma outra realidade onde se vive apartado dessas alienações, pois você vive irredutível a essas relações sociais que se impõem, o absurdo. Camus pensa o sol como emblema de gratuidade, de acaso. Estar aberto a essa gratuidade é viver relativizando aquilo que te determina, te condiciona.
Pedro: Manuel, muito obrigado pela entrevista. Assim que for possível, faremos outra, para abordar outros tópicos sobre Albert Camus.
MCP: Foi um prazer e estou à disposição.
Pedro: O que você acha de Camus ter feito carreira jornalística em um jornal como o Combat, durante a Segunda Guerra Mundial? Seria útil estudar o jornalismo dele nos dias de hoje?
MCP: Quanto ao Combat, foi um jornal publicado pela Resistência Francesa, sendo da época de um Camus saindo da Argélia miserável para morar na França. E, da mesma forma que ele formula uma idéia de absurdo que não está ligada a um período histórico específico, ele verifica a dimensão histórica desse absurdo. Há uma frase que ilustra isso em O Verão, “o homem não é totalmente culpado já que ele não inventou a história, nem é totalmente inocente porque a continua”. Ele vê na história a materialização de situações absurdas, que exigem participação ou engajamento, com a consciência que isso não elimina o absurdo, que é algo anterior a própria história. Dessa forma, o tempo de intervenção dele no Combat, assim como suas contribuições no L´Express, um outro jornal francês durante os anos 1950 e a Guerra da Argélia, será criadora de textos cuja responsabilidade política do intelectual se manifesta intensamente. Participando de jornais clandestinos, ele ajudava pessoas contra o regime nazista. Essa postura, no entanto, não esgota a luta política em si. Nesse aspecto, Albert Camus é muito diferente de outros escritores de sua época, que viam na literatura de ficção, na prosa em geral e na dramaturgia um caráter ideológico e pedagógico, engajado. Ele não era politizado nesse sentido, pois ele formula a idéia de absurdo em relação ao que é chamado de condição humana, termo do antigo humanismo do século XVI e XVII. Apesar da uniformidade do homem nesse conceito, Camus ainda consegue colocar que há manifestações específicas desse absurdo. Ele sempre oscila nesse universal e específico. Quando ele vai para o interior da Argélia e escreve uma verdadeira reportagem ao jornal Combat, ele denuncia as condições sub-humanas dos berberes, povo nômade do deserto. Isso dá o tom em seus artigos jornalísticos, que tratam de muitos assuntos específicos, como a Guerra da Argélia.
Pedro: E o ensaio, como se insere nesse processo?
MCP: O que migra do ensaio para seus textos de intervenção é o combate ao totalitarismo e às ideologias assassinas como imperativo categórico moral que deve ser seguido, mas sem transformar a história em um fim, um reino, em si mesma. Fazer isso, do ponto de vista dele, é justificar a própria história em sua plenitude. Seria justificar qualquer ação histórica, transformando o assassinato em regra porque, eventualmente, você estará do lado correto de quem é assassino ou é assassinado. Se você comete o “bom” assassinato, o assassinato revolucionário, você não é mais compelido a cometer esse radicalismo, mas o transforma em uma prática. Foi isso que ele visualizou no comunismo, estabelecendo uma linha de continuidade entre o nazismo e a própria doutrina comunista, sendo a principal questão de discordância em relação aos pensadores de esquerda. A história não esgota a nossa vivência com a realidade, que precede ela mesma. Portanto, ela não pode prever um desacordo entre o homem e seu mundo. O fato de ter uma atividade jornalística que denuncia e critica questões diversas, como injustiças financeiras e étnicas, não o coloca com postura de ideólogos tradicionais, mas coloca o próprio Camus em diálogo com suas duas percepções claras da realidade.
Pedro: Por que explorar Camus pelo ponto de vista dos moralistas franceses?
MCP: Pensar ele pelos moralistas redimensiona o pensamento dele em relação ao absurdo a luz de uma tradição de ceticismo moral e filosófico. Essa relação com Camus faz com que a filosofia não tenha idéias independentes do mundo, pois existe sempre uma dimensão concreta do pensamento. Você não generaliza mais, você não tem mais generalizações conceituais que são opressivas e impõem uma interpretação do mundo que respeite o homem concreto, o homem em sua variedade e precariedade. Nisso, os moralistas franceses ao trabalharem não mais com o conceito abstrato e universal, mas sim a notação do real em suas nuances, quase ficcionais, são mais realistas e respeitadores das descontinuidades do provisório que há no homem, irredutível a uma forma. Um dos problemas da metafísica é reduzir o homem a forma.
Pedro: Como funciona o mito solar na obra de Camus? Isso vale para os dias de hoje?
MCP: Essa dimensão solar em relação no mundo de hoje está na figura mítica do Sol, que permite pensar em valores e percepções atemporais fruto do encontro entre o homem e a realidade independente da história. E isso evita que se transforme a história em uma máquina que aliena. Nos tendemos hoje a pensar como seres sem sujeitos, historicamente. Isso, de hoje, é uma coisa que nem passava pela cabeça de Camus e dos existencialistas. Nós pensamos nas nossas determinações materiais, históricas e biológicas hoje em dia. O que Albert Camus jamais imaginou é que nós pudéssemos pensar nossa realidade como necessidades neurofisiológicas, como se tudo tivesse uma causa, uma materialidade ou alienação perante uma realidade. A “celebração dessa vivência solar” em Camus é um emblema ou símbolo de uma outra realidade onde se vive apartado dessas alienações, pois você vive irredutível a essas relações sociais que se impõem, o absurdo. Camus pensa o sol como emblema de gratuidade, de acaso. Estar aberto a essa gratuidade é viver relativizando aquilo que te determina, te condiciona.
Pedro: Manuel, muito obrigado pela entrevista. Assim que for possível, faremos outra, para abordar outros tópicos sobre Albert Camus.
MCP: Foi um prazer e estou à disposição.
Entrevista feita originalmente para monografia de iniciação científica no Centro Interdisiplinar de Pesquisa (CIP) da Faculdade Cásper Líbero.
Para mais informações: http://www.facasper.com.br/cip/
2 comentários:
"Pedro: Manuel, muito obrigado pela entrevista. Assim que for possível, faremos outra, para abordar outros tópicos sobre Albert Camus.
MCP: Foi um prazer e estou à disposição."
Pedro Zambarda de Araújo 2º ano de Jornalismo,
Não é assim que se termina a edição de uma entrevista. O quê você está informando aí? NADA!
Essa porcaria não interessa a ninguém! A não ser ao seu ego de arrombado.
Quem é mais egocêntrico, alguém que comenta que o outro é "arrombado" ou quem simplesmente colocou uma matéria que não te interessa?
Não gostou, não precisa ler. Ninguém aqui está te obrigando a isso.
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