Nascida em Portugal e radicada no Brasil, Cremilda Medina é jornalista formada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, pesquisadora e professora titular da Universidade de São Paulo. Atua há mais de 40 anos na área e publicou 13 livros de sua autoria. A vasta experiência e dedicação a pesquisas na disciplina tornaram a jornalista um modelo pragmático da contemporaneidade. Trabalhou nos periódicos Jornal da Tarde e O Estado de S. Paulo e, neste último, desenvolveu um trabalho de 10 anos nos cadernos de arte e cultura. Nesta entrevista baseada em seu livro “Entrevista: o diálogo possível”, Medina fala do início de sua carreira, do interesse em se dedicar às pesquisas e estudos acadêmicos, do trabalho realizado no jornal O Estado de S. Paulo (principalmente no entrave entre o factual e o atemporal), dos problemas que atingem o mercado da área como advento da tecnologia, manuais de redação e o autoritarismo institucional, e ainda aconselha os jovens jornalistas sobre como lidar com a profissão.
Thatiana Rós - Cremilda, eu queria saber quais fatores da sua infância que influenciaram na escolha pelo curso de jornalismo? A senhora sempre gostou de escrever ou teve alguma influência de fora, da família, por exemplo?
Cremilda Medina - O que realmente mais marcou foi primeiro, durante o ginásio que eu fiz em Porto Alegre, eu vim de Portugal com 11 anos e meus pais me radicaram em Porto Alegre, aí de Porto Alegre eu fui parar no Colégio Farroupilha. E, o fato de eu ter ido parar na escola de alemães, ou descendente de alemães, fez com que eu me destacasse em Português. Então, a língua e literatura foram muito próximas em toda a minha formação ginasial. Agora, quando eu estava no 3° ano do colegial clássico, eu fiquei com muitas dúvidas do que eu ia fazer de faculdade, eu acho que aí é que está o momento importante. Bom, aí eu fiz uma reflexão comigo mesma, o que até hoje eu me surpreendo, e eu não queria me fechar em nenhuma área a não ser naquela que me desse uma possibilidade de trânsito social, de relação com os outros, de vir ao mundo com relação com outros e por isso eu decidi jornalismo. O que foi um tumulto em casa. O curso de jornalismo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul começou em 50 exatamente e eu fiz o vestibular em 60. Na época, fiz o de jornalismo e o de letras. Era possível, na Universidade Federal daquele tempo, fazer dois. E, acontece que passei em 1° lugar em letras clássicas, que era Português, Grego e Latim e em 2° lugar em jornalismo. Mas, enfim, eu teimei, bati o pé como bati com meu pai, e terminei fazendo do curso de jornalismo. Ele foi a centralidade da minha vida universitária. A minha mudança para São Paulo foi por conta da Universidade, também porque eu em 68, em 67 mais precisamente, já era jornalista em Porto Alegre e tal, e fui chamada para dar aula na universidade federal no curso de jornalismo e assumir o jornal laboratório com os alunos. Que era preciso, pesquisar, inovar, estudar. Daí surgiu à notícia de que a ECA iria criar, isso no fim de 1960, início de 70, a primeira pós-graduação da América Latina. E aí em 1971 eu preparei tudo, já estava casada, com dois filhos e tal, para vir para São Paulo fazer a pós-graduação licenciada pela Universidade Federal. O fato é que dessa mudança para cá resultou a pesquisa. Então, dar aulas na Universidade de São Paulo significa ter um projeto de pesquisa e não simplesmente ensinar aquilo que a gente já sabe. Agora, o fato é que efetivamente, a arte e a literatura em particular sempre estiveram presentes na minha vida, isso eu digo bem nesse texto “O Povo e o Personagem”. E eu me orgulho muito, porque eu vim para São Paulo para ingressar nessa afinidade de pesquisa e resulta-se como mestrado da ECA. O trabalho foi o primeiro da América Latina e eu sou a primeira mestra formada em 75. Finquei pé nesse continente. Embora, eu tenha viajado muito, tenha feito outras coisas fora, mas a pesquisa sempre foi voltada para vocês, para nós, para os grupos de trabalho aqui no Brasil.
Amanda Sousa - No Estadão, a senhora ocupou as editorias dos cadernos de arte e cultura. Como foram essas experiências?
Então, essa é uma experiência que foi a mais longa do ponto de vista de mercado, porque eu sempre trabalhei com mídias, gosto muito de televisão, trabalhei na TV Cultura, na TV Bandeirantes, mas nesse período de dez anos no Estadão, foi assim o mais longo e por isso vou para implantar um trabalho de gratifica muito, um trabalho chamado que é o jornalismo cultural. E esse projeto foi um projeto de dez anos que eu tive chance de realizá-lo no Estadão, e numa época muito complicada, ainda diante de uma ditadura de censura, e uma série de obstáculos dessa natureza. No entanto ela me deu toda essa possibilidade de desenvolver um trabalho e o importante de salientar que a síntese dos intelectuais brasileiros da área de arte e de filosofia e repercussão foram importantíssimas na resistência à ditadura. Então, dar voz a esses artistas e a esses pensadores foi muito gratificante porque a gente estava na frente da luta de oposição a ditadura. E a censura e a repressão eram tudo que ele levou depois para sociedade civil a democratização do país. O Estadão foi importante por isso, porque ele estava nessa frente de luta, e ai a editoria de arte era a linha de frente. Porque todo o ato jornalístico é cultura, não é apenas a arte, ou a filosofia, ou o pensamento intelectual ou o pensamento de reflexão que pode ser chamado de cultural, qualquer editoria produz cultura. Então, é mais conveniente ser chamado, de editoria de arte do que chamar de cultura.
Mariana Campos - Você não acha que perdeu um pouco a essência do caderno de cultura, que misturou um pouco de entretenimento com cultura, outro tipo de entretenimento como fofoca?
Não, esses deslizes mais sensacionalistas existem em todo jornalismo. Na época que eu estive no Estadão estava em discussão no meio artístico, no meio literário e artístico, o desaparecimento do suplemento literário do Estadão, que foi muito marcante. Então, era assim um espaço nobre da área de arte, mesmo depois que desapareceu, eu achei isso absolutamente normal porque é uma dinâmica de alteração de editoriais, sai o suplemento literário e depois surge o sabático, e depois surge num sei o quê e, então isso é uma dinâmica de mercado, o fato é que produzia sentido, ou seja significado para as coisas é a cultura. Agora, o entretenimento que você se refere ao lúdico, o lazer é muito importante, o lúdico é muito importante para nós, para nossa vida cotidiana, como é que se vai deixar então uma coisa séria, carrancuda, sem nada de entretenimento, sem o lúdico. Então, para fazer um textinho humano, uma historia humana em uma matéria jornalística, coisa que a Folha não sabe fazer, por exemplo. Os textos da Folha são meio duros para fazer, mas a gente encontra em outras mídias, ou na televisão, ou no Globo Rural, ou no Globo Repórter, você tem que ter essa abertura, para a beleza do lúdico, inclusive o lúdico da palavra. Por que se você capta o jeito das pessoas se expressarem, fica muito gostoso trabalhar. Você não fica só lá com aquela redação padrão, aquela chatísse, da piramide invertida, do lead primário, toda aquela tralha de tecnica dogmática, tecnica enferrujada. Você não tem oportunidade de apreciar, de sentir, de se divertir inclusive com a palavra do outro, que é muito gostosa de perceber. Então se o entreterimento é um entreterimento dessa natureza, e não uma exploração sensacionalista de se falar, furungando na ferida e tal, eu acho quem deveria estar presente em todas as editorias, a começar pela política, economia, para todas. Enfim, há essa experiência humana é o cotidiano.
Thatiana Rós - A senhora sempre se dividiu entre a vida acadêmica e o jornalismo factual. Quais foram as constribuições que a vida academica trouxeram ao dia a dia como jornalista?
É um casamento mútuo que eu nunca consegui fazer a divisão do prático com o teórico. Sempre tem um alimento múltiplo. Ou seja, quando a gente está produzindo alguma coisa pratica, todo nosso arsenal de estudo está presente. E quando a gente está no arsenal teórico, às necessidades práticas interferem na linha de pesquisa. A linha de pesquisa pede às necessidades que a gente sente para trabalhar, para produzir. E o que eu acho que une as duas coisas é o que já defini neste livro [Entrevista: o diálogo possível] que é a responsabilidade social. Desde a minha decisão de ir ao outro, mudar o rumo, circular pelo mundo. Eu quero estar no mundo! Então este meu laço social com o mundo, esse vínculo de responsabilidade perante este outro que esta a minha frente é o que une a teoria e a prática.
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Iara Aurora - A primeira edição do seu livro “Entrevista: o diálogo possível” foi lançada em 1986, 24 anos atrás e muitos probelmas destacados na obra continuam existindo hoje. Houve transformações no método de entrevista e de apuração? Pois, naquela época os repórteres saiam mais a campo e hoje muitas entrevistas são feitas por e-mail.
É, estes problemas persistem porque eles transcendem os problemas ao suporte a a técnica. E a visão de mundo independe de você ter técnicas e tecnologias a sua disposição. Você pode ser dialógico com ou sem técnica agora você pode ter monológico ou com uma maravilhosa tecnologia a sua disposição. Então, talvez seja isso que de essa discussão século XXI. Você me pergunta se as máquinas estão retroagindo aos veículos de comunicação. Eu acho que há esse risco bastante acentuado. Por mais que você use a máquina, por mais que eu use a inteligência artifcial, por mais que eu use a inteligencia natural eu vou ficar atrás da máquina. A racionalidade humana funciona bem se você tem o contato possivel com o mundo. É a partir desse contato que a inteligência humana funciona bem ou é plena, se você passa a deixar de ter contato com o mundo, é a partir desse contato que a inteligência racional funciona. A entrevista digital é útil, perguntas e respostas, quando você esta no mundo das ideias, se estiver no mundo das ideias, tudo bem. Você está ligado conceitualmente, você encena uma resposta conceitual. Agora, se você não está no mundo das idéias, está no mundo vivo, a entrevista digital não tem cheiro, não tem paladar, não tem tato. É a atrofia de três de nossos sentidos de contato, nos exercitamos o olhar vendo o que a gente quer e a audição escutando aquilo que a gente quer. Mas os três importantes que marcam o contato é o paladar, tato e olfato. Por isso que fazer uma reportagem sem esses três elementos, é uma reportagem capenga, ela não tem plenitude de vida, ela não vibra.
Mariana Campos - Ainda no seu livro ‘Entrevista, o diálogo possível’ a senhora classifica a entrevista em dois grupos, uma com um objetivo de espetacularização e outra com o objetivo de compreensão. De que maneira o jornalista deve atuar para alcançar a compreensão do leitor?
Eu acho que hoje eu resumiria em compreensão, mas eu estou cada vez mais anti-classificatória. Eu diria que o fundamental é o hábito compreensivo, tudo o que o que escapa deste abrir-se a compreensão é autoritário. A gente tem que entrar no mundo, na relação com os parceiros da história. Eu já fui armada para uma entrevista, como, por exemplo, uma vez no Estadão, o dono do boteco, que já morreu o Julio Mesquita definiu que seria eu que iria entrevistar o Carlos Lacerda. E eu disse para o meu editor: ‘olha, eu tenho diferença histórica com o Carlos lacerda’. Lá na minha juventude em Porto Alegre, corria no nosso imaginário que ele mandava matar os mendigos para eliminar a pobreza no Rio de Janeiro. Mesmo assim, eu tinha uma algebriza de direita, conservadora, aquela coisa de esquerdismo, típico da juventude. Então, ele exigiu que eu fosse, mas eu falei que não sou a melhor pessoa, que não gosto dele, eu fui armada. Com toda aquela minha bagagem ideológica dos anos 70, da minha juventude, da minha primeira fase profissional. E quando cheguei diante dele, a inteligência dele é brilhante, ele é uma pessoa cativante, eu me rendi, me desarmei, conversei com ele, e produzi um texto desse encontro que rendeu um cartão dele no dia seguinte que mandou para o Julio Mesquita. O Julio Mesquita mandou me chamar, mostrou o bilhete dele, fui borrada de medo do tipo ‘vou ser demitida hoje’, ai ele era muito duro, cheguei na frente dele, ele mandou eu sentar, ele era muito amigo do Carlos Lacerda ai ele disse: Ó, pra você! Ai, o Carlos Lacerda dizia coisas do tipo: a repórter que você mandou que visivelmente não pensa como eu, mas foi muito profissional, um monte de elogios. Então, esse desarmamento que eu fui forçada a ter por causa da personalidade do Carlos Lacerda. Eu aprendi que seria realmente o mais viável e conveniente para isso que eu chamo de responsabilidade com o outro. Então, por mais que eu saiba que o outro é diferente de mim, eu tenho que desarmar das minhas, dos meus pressupostos, da minha ideologia para tentar compreender quem é esse homem. A cobertura das revistas brasileiras denuncia uma visão aprioristica e ideológica para cobrir a guerra do Iraque que não tem nada a ver com o ato de compreensão.
Thatiana Rós - Professora, sabendo que o autoritarismo institucional acentuou a limitação de vozes da comunicação coletiva, muitos jornalistas deixam de cumprir seu dever de informar as várias versões da realidade através da pluralidade de fontes. Existe uma maneira de o jornalista exercer sua ética sem se corromper com essa limitação?
Se ele preserva a sua autoria, se ele se recusa a fazer essa encenação precária, mentirosa, do a favor e contra. Isso, não é exercer a sua autoria profissional, porque o mundo não se resume a favor e contra. Pegar o telefone, pegar uma declaração a favor, outra declaração contra, pronto tá resolvido o problema. Isso é enganar o freguês. A verdade, não é a verdade que você vai trazer aí nessa brincadeira, mas, sim a luta das verdades. A luta das verdades são as muitas das verdades que estão por aí, é claro que agente nunca consegue atingir o ideal que é uma pluralidade plena de divisões, de imersão. Mas, você sempre se angustia e sempre você vai ao máximo possível com aquela abertura de que tem mais, até onde for possível pra fechar a matéria. Uma autoria é substantiva, ela é consistente, quando traz essa polifonia, essa polissemia, por exemplo, a herança maldita do Fernando Henrique, eles pegam e eles trincham o que não é uma herança maldita, mas mostrando através de fatos, de dados e elementos, então a monossemia quer dizer a versão única do autoritarismo ela só é atacada, ela só é higienizada se você faz um esforço de montagem dessa monossemia para uma polifonia e uma monossemia para uma polissemia. Isso que está escrito aí continua sendo o dilema de um trabalho sujo, porco, feito nos joelhos ou trabalho de autoria, um trabalho respeitável, sério, digno de uma autoria.
Ana Claudia Cabanas - Ainda no livro, a senhora fala dos problemas relacionados ao manual de redação que fazem parte das empresas jornalísticas que seguem a caracterização dos trabalhos desde pauta até a publicação. Atualmente qual o perigo que os jornalistas enfrentam em relação a isso?
Todos, mesmo o pior. Agora tem um trabalho de uma jornalista brilhante que esta por ai na praça, que é a Patrícia Patrício ela dirige agora as revistas das FATECs. E o que ela fala é o que realmente você já tem essa impressão de quem começa a trabalhar de que o manual é uma dogmática, uma gramática para o jornalismo que não corresponde à autoria dinâmica criativa que a nossa profissão exige. E vocês vejam como compromisso com a nossa sociedade. Se você vai seguir aquelas regrinhas você se torna um burocrata, tanto faz trabalhar num caixa de banco como no jornalismo, se você segue aquelas regras. São regras que realmente ajudam a disciplinar industrialmente a profissão, mas como agora a profissão é própria industrial, não tem mais sentido, porque você agora tem autoria autônoma, online e tal. Agora, para disciplinar industrialmente as editorias e os manuais servem de baliza, seguidamente se os próprios jornalistas dessas empresas comprariam, por isso que algumas empresas não têm manuais.
Mariana Campos - O grande problema enfrentado, por exemplo, no caderno de artes é de manter o meio termo entre o factual e o atemporal. Como um crítico de cultura pode lidar com isso?
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É muito interessante você levantar esse aspecto. Morreu agora, há duas semanas, infelizmente, um jornalista que trabalhou comigo, que tinha sido aluno na ECA na década de 60, depois ele foi para o jornalismo econômico, e aí ele veio para arte trabalhar comigo no Estadão, o Mauricio Lelo. O Mauricio Lelo chegou um dia para mim e disse: eu queria te propor o seguinte, os serviços de teatro, cinema, música, rádio, ele fazia um programa de rádio muito interessante que não existia em nenhum outro jornal, que nós produzíssemos uma pequena frase do conteúdo daquela peça, daquele filme, ou daquela exposição de arte plásticas. Eu disse: claro, experimenta, vamos lá! E ele introduziu o que hoje é banal, no Estadão pelo Mauricio Lelo, que criou uma frasesinha para definir um filme, uma peça de teatro, porque era assim muito seco, tal hora, tal lugar, aquela coisa assim sem nada. Vejam o que é a autoria, o serviço seco, passa a ser um serviço de informação a mais, um “plus a mais”, uma informação muito importante. E isso se consagrou e deu origem a um serviço que afinal tem um pouco mais do que um árido serviço. A outra estrutura de pé, era a informação factual, que você está falando. O acompanhamento de tudo o que acontece na arte. E nós tínhamos o princípio, o grupo de fugir do centro do acontecimento, do chamado centrão das artes, das artes estabelecidas e ir para a periferia. A periferia de São Paulo é riquíssima em manifestações. Então, nós também fazíamos o factual com a periferia, não apenas no centrão do Brasil e de São Paulo. Isso era muito importante, porque era a grande realização na reportagem para o repórter de arte. Não simplesmente ele ser um portador, um porta voz dos releases que chegaram a informação, mas era dele ir ao mundo buscar essas informações. E finalmente, o terceiro pé também era muito cultivado, que era o da crítica. Como administrar isso? Eu fiz uma experiência única, não quero aqui me vangloriar, realmente foi única, fui considerada maluca por causa dessa experiência, que era fazer um encontro mensal de críticos e repórteres da editoria para debaterem o confronto entre o repórter e o crítico. O crítico achava que o repórter era um ignorante; e o repórter achava que o critico era um sujeito insuportável. Então, eu reunia uma vez por mês o corpo de crítico e o corpo de repórter para quebrarem o pau; para o crítico dizer: olha você está chamando de peça o que é espetáculo, o que é espetáculo está chamando de peça, você não sabe nada disso. Aí quebravam o pau. Aí o repórter dizia assim: você mandou um texto de crítica que ninguém pode ler, porque tem não sei quantas linhas a mais, e porque as palavras que você usa. Então, era maravilhoso isso, quer dizer administrar o conflito. Mas, era um conflito que nasce alguma coisa. De maneira que os críticos tinham um diálogo muito rico com os repórteres, e o factual não brigava com a crítica; nem a critica com o factual, se harmonizavam. Mas, se a gente tem então uma proposta, uma visão, uma filosofia de trabalho, isso vai indo e vai se realizando na medida enfim, das possibilidades do grupo e da própria empresa e tal. Não é fácil, não é tranqüilo, é conflito constante. Mas, você tem naturalmente que lutar e usar argumentos consistentes. No “cotidiano do dia a dia” as pessoas são fracas as vezes, acho que não querem se incomodar, vão levando de qualquer jeito. Eu não, porque eu tenho na minha carteira profissional 14 pedidos de demissão, que eu pedi demissão. Quando bate no teto dos meus limites éticos e profissionais, eu vou caçar trabalho, vou ter meus filhos para alimentar, minha casa para pagar e tal, mas eu vou embora, não quero saber. Então, eu acho que a gente tem que se manter dentro dessa proposta, da sua visão das coisas e sempre na luta, não tem como escapar, não há trégua. Guerra permanente.
Amanda Sousa - A senhora busca desde 1970 o fazer jornalístico e apesar das dificuldades que encontrou pelo caminho nunca desistiu. Hoje muitos dos jovens jornalistas que estão iniciando essa profissão, eles criam a expectativa em relação à profissão e muitos acabam se decepcionando. O que a senhora diria para os que estão começando, para eles não desistirem e para que eles tenham força para enfrentar o naufrágio e assim alcançarem o Diálogo Possível?
Primeiro se manter como repórter, não ceder a sedução da carreira, se logo vinga para a burocrática, para você ganhar dinheiro, para você ter poder, tal, e sobe na carreira e deixa de ser repórter. O abandono da reportagem, o hábito de ser repórter mata o vigor do jornalismo. Segundo, eu acho que é essa questão do compromisso, manter o compromisso social, que é coerente com a sua decisão de jovem. É uma decisão ética, decide porque gosta, tem um gosto e um compromisso de estar ligado ao seu tempo, na atualidade, a parceria histórica, a parceria com o outro. Se você mantém esse compromisso e você permanece no seu estado de repórter você termina se alimentando na rua com os outros, da chamada comunhão da luta. Eu acho isso uma paixão, apesar de tudo, estamos aí.
Da esquerda para a direita: Ana Claudia, Thatiana, Mariana,
Cremilda Medina, Amanda e Iara