domingo, 5 de janeiro de 2014

Andre Matos fala sobre carreira solo, Angels Cry e mercado brasileiro de heavy metal

Conversamos com o cantor e compositor Andre Matos, fundador das bandas Angra e Shaman, que atualmente segue em carreira solo comemorando os 20 anos do disco Angels Cry, lançado em 1993.

Entrevista por Pedro Zambarda de Araújo.
Via Ultimate Music Press. Originalmente publicado na Whiplash.net.


1 - Hoje, tocando uma carreira solo, você se sente como um músico livre, por mais que tenha arranjado conflitos durante sua carreira?

Andre Matos - Se houve alguns conflitos durante minha carreira foi por tentar fazer, e às vezes até impor, o que considerava certo, tanto musicalmente, quanto moral e profissionalmente. Nunca busquei quaisquer conflitos, mas eles são comuns em qualquer profissão que se escolha. Há de saber aceitá-los como parte da vida e usá-los a favor de um maior auto-conhecimento.

A carreira solo não foi uma escolha, mas uma necessidade. E, sem dúvida, por mais que isso me acarrete mais responsabilidades hoje em dia, sinto-me bem mais livre. Hoje, se houver dúvidas ou conflitos, eles são resolvidos imediatamente, de maneira clara. Do ponto de vista musical, a liberdade é ainda maior. Minha banda abarca uma carreira de 25 anos e podemos passear por todo o repertório com tranquilidade, além de produzir sempre material novo, pois já estamos no terceiro álbum de estudio. Foi difícil no começo, no entanto, agora posso dizer que a carreira está solidificada e é definitiva.

2 - Sua volta ao Viper em 2012, celebrando discos como Soldiers of Sunrise, foi uma espécie de preparação para as comemorações da estreia do Angra?

AM - Sem dúvida, porque foi aí que nasceu a ideia de uma turnê comemorativa também em 2013. A turnê do Viper estava prevista para durar apenas um mês e acabou se estendendo por cinco! E o mesmo aconteceu com a turnê atual da banda solo, pois sabíamos que iríamos participar de festivais como Abril Pro Rock e Rock in Rio, mas não imaginávamos que permaneceríamos ocupados até os últimos dias do ano, quase ininterruptamente. A tour foi um sucesso e o tributo ao Angels Cry teve uma importância crucial, porque era algo que as pessoas estavam esperando. Se vamos continuar fazendo turnês comemorativas ou não, isso não ouso afirmar.

3 - Você sabia o que Angels Cry se tornaria, 20 anos depois?

AM - Não tinha a menor ideia. Assim como não tinha em relação ao Theatre of Fate, ao Ritual, ao Virgo, ao Time to be Free. Cada álbum tem o seu tempo de maturação e a sua maneira particular de entrar para a história. Muitas vezes um álbum é composto e produzido não exatamente de acordo com o tempo presente, mas mirando o futuro, à frente de seu tempo.

4 - Como foi tocar Angels Cry sem seus antigos companheiros do Angra? Foi por opção? Bate uma nostalgia ao tocar Angels Cry na íntegra?

AM - O clima que percebo não é de nostalgia, mas sim de celebração. É muito empolgante ver a resposta do público às músicas deste disco que fez história no Brasil e no mundo. Quanto aos músicos que me acompanham, estou mais que satisfeito com a performance da banda solo porque eles estão tocando as composições com perfeição. Não me recordo dos arranjos soarem tão precisos ao vivo em toda a carreira, e estamos agradando por onde passamos. A escolha deste tributo foi uma sugestão já antiga. A ideia se provou viável depois da turnê de reunião do Viper, com Soldiers of Sunrise e Theatre of Fate ao vivo. A única condição para se fazer o Angels Cry era a de tocar o disco na íntegra, do início ao fim. Deste ponto de vista, foi um grande desafio, mas que acabou se transformando em diversão no decorrer dos shows.

5 - Como é competir com shows internacionais no Brasil hoje?

AM - Não podemos competir, mas sim conviver com eles. A verdade é que os shows internacionais tornaram-se tão ou mais freqüentes quanto as apresentações de bandas nacionais. Então, tudo passa por uma questão de qualidade. Ofereça a mesma qualidade e mantenha o seu público fiel, para não haver a necessidade de competição. Obviamente, é aconselhável optar por datas que não sejam conflitantes, para não colocar o seu próprio fã em xeque. Antigamente isto não era tão drástico, mas a quebra da indústria fonográfica obrigou todos os artistas a estarem na estrada o tempo todo. Veremos até onde isto deve chegar.

6 - Andre, você acredita que fez discípulos no heavy metal? Que novos cantores você destacaria nos últimos 10 anos? Eles foram influenciados diretamente por você?

AM - Muitos jovens vêm constantemente até mim e fazem questão de declarar que me incluem entre suas principais influências. Isso é motivo de orgulho pra mim. Não deixo, no entanto, de alertar para que cada um deles busque sempre uma identidade própria. Influências são importantes e até mesmo necessárias, mas não como um fim em si mesmas. Há diversos bons cantores e cantoras que surgiram no Brasil nos últimos anos. Citar apenas alguns seria injusto. Não deixo de valorizar também os mais antigos que continuam em constante evolução.

7 - O que falta ao heavy metal atualmente?

AM - Criatividade? Ousadia? Coragem? Sair da chamada "zona de conforto"? Não sei, retribuo esta pergunta a você e aos próprios leitores! Como costumo dizer, a última coisa "nova" que apareceu dentro da música pesada, e que me chamou realmente a atenção, foi o Rammstein. A vinda deles já faz quase 15 anos! Mas este é um ponto de vista estritamente pessoal. Gostaria, na verdade, que algo hoje em dia me surpreendesse tanto quanto eles me surpreenderam naquela época.

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