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Mídia Ninja participou do programa
Roda Viva, da TV Cultura, na noite da última segunda-feira (5), às 22h. O nome de coletivo de comunicação é uma sigla para Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação e foi representado pelos fundadores Bruno Torturra (
@torturra), que é jornalista, e por Pablo Capilé, produtor cultural.
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Bruno Torturra (ex-Trip e Esquenta, da Rede Globo) e Pablo Capilé |
Os entrevistadores foram Caio Túlio Costa (fundador do UOL, professor da ESPM), Eugênio Bucci (professor da ECA-USP e colunista da Época e do Estado de S.Paulo), Alberto Dines (ex-Jornal do Brasil e Observatório da Imprensa), Suzana Singer (ombudsman da Folha de S.Paulo) e Wilson Moherdaui (diretor da revista Informática Hoje).
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Eugênio Bucci em um debate caloroso com a Mídia Ninja |
O que se viu no debate da televisão foram jornalistas tradicionais agressivos contra a Ninja, que faz uma cobertura dos protestos em São Paulo e no Brasil defendendo os manifestantes de maneira engajada. Do lado dos Ninjas, se viu explicações complicadas de Pablo Capilé sobre o financiamento através das atividades do coletivo artístico
Fora do Eixo, que existe há cerca de 10 anos (desde 2001) e que contribuiu para divulgar Gaby Amarantos, cantora de tecnobrega.
Para entender a Ninja, também é recomendável ler o texto de Torturra chamado "O Ficaralho", publicado no blog
Casca de Besouro. Ele trata sobre a precarização do trabalho dos jornalistas que permanecem nas redações após as demissões em massa, os chamados "passaralhos".
Capilé, quando perguntado por Suzana Singer sobre um patrocínio de 800 mil reais da Petrobras, não escondeu suas afinidades com o PT de Lula, José Dirceu e Dilma, que foram explícitas em suas fotos de Facebook. "Mas temos proximidades com todos os partidos. Já o PSDB tem uma tradição de não se aproximar dos movimentos sociais", disse o ativista e produtor. Torturra, diferente do amigo, mostrou simpatia à Rede de Marina Silva, novo partido, e até ao tucano Fernando Henrique Cardoso, que apresentou uma proposta "interessante de liberação de drogas", na opinião do jornalista. Bucci, entre os jornalistas, foi um dos que insistiu em colocar a questão de simpatia ao Lula e sobre o financiamento estatal por trás da Mídia Ninja. A primeira questão pareceu desimportante, por querer associar o trabalho de jornalismo ao suposto esquema de corrupção do PT. A segunda pergunta foi mal explorada, e só melhorou em alguns momentos quando se discutiu, de fato, publicidade na imprensa.
Eu fui ao programa como tuiteiro. As reações das pessoas quanto ao programa oscilaram entre decepções quanto às respostas da Mídia Ninja e também quanto ao desempenho agressivo de jornalistas antigos, que trabalharam em grandes empresas como Globo, Abril e outras. Outras pessoas agiram com entusiasmo quanto à cobertura online promovida pela Ninja, seja pelas fotos de Facebook ou através de seus vídeos ao vivo nos protestos, transmitidos via streaming. Um sentimento de pessimismo quanto ao jornalismo tradicional foi propagado em outros comentários. Um grupo de pessoas também questionou, novamente, a sustentabilidade do jornalismo dos Ninjas.
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Foto minha que rolou no Facebook, com o pessoal da Ninja. Estou no centro |
"Multiplicamos um investimento público por 15, 20 e até 25 vezes. Tudo isso graças à nossa capacidade de desmonetização de alguns processos", explicou várias vezes Pablo Capilé, sobre um modelo que substitui dinheiro por cards, dentro de seu grupo. Segundo o produtor, o coletivo, tanto a Ninja quanto o Fora do Eixo, gira em torno de uma rede com cerca de dois mil colaboradores, que convivem em moradias coletivas. Cada moradia coletiva custa aproximadamente 25 mil reais e, cada pessoa, 900 reais. Começou em quatro cidades: Cuiabá (MT), Rio Branco (AC), Uberlândia (MG) e Londrina (PR). Agora já está em 25 dos 27 das unidades federativas brasileiras. A captação de dinheiro se dá por festivais musicais.
Isso ficou mais claro na fala de Torturra: "Temos algumas ideias de como financiar. Não possuímos ninguém da área de finanças e somos empíricos. A gente quer lançar um crowdfunding nesta quarta-feira (7) com a Agência Pública. Hoje eu estou totalmente dedicado à Mídia Ninja". Sobre sua situação, o jornalista foi mais dramático: "Sobrevivo de uma festa que promovo quinzenalmente em São Paulo, que não paga minhas contas ainda e nos últimos tempos não tenho tido tempo pra freelances. Recebi recentemente um dinheiro da produção do programa Esquenta, da Rede Globo. Atualmente sobrevivo do meu saldo negativo".
Mesmo assim, a Ninja se mostrou como uma representante moderna da imprensa, que se desenvolve após a industrialização da profissão, como foi ressaltado pelo apresentador, Mário Sérgio Conti. O âncora do programa mostrou uma publicação da revista Jornalismo ESPM trazida por Caio Túlio, com a chamada "Jornalismo na era pós-industrial". Seguno o texto, nossa profissão não é mais composta por um "operário da informação", mas sim por outras práticas profissionais. "Eu sou otimista quando a minha sustentabilidade, com uma juventude que tem muito mais liberdade e abertura hoje pela capacidade tecnológica. O jornalismo é pós-industrial, mas vive ainda com uma lógica do início do século passado. A gente vive em uma lógica antiga, onde prédios de 20 andares e publishers com alto lucro fazem sentido", disse Bruno Torturra, alfinetando os negócios de comunicação que existem hoje, taxados por muitos como anacrônicos.
"Há 10 anos vivemos isso na música, com a primeira grande crise dos intermediários (as gravadoras). Boa parte dos novos artistas começaram a surgir de pequenas redes que se retroalimentam o tempo inteiro. São alternativas de sustentabilidade. Isso agora vai se estabelecendo na crise de intermediários que existe agora no jornalismo", disse Capilé. O ex-guitarrista utilizou vários exemplos das turnês musicais que salvaram a indústria de entretenimento. Mas o jornalismo faz show? A lógica da comunicação não é outra?
Alberto Dines, do Observatório, fez críticas à cobertura jornalística dos Ninjas na vinda do Papa ao Brasil. Foi um dos melhores debatedores da noite, apesar de não ter feito comentários relevantes no começo do programa. Para Dines, a falta de cobertura da Ninja favorece a pouca discussão sobre a situação do Estado laico no Brasil.
O Roda Viva com Mídia Ninja e com os entrevistadores conservadores, seja politicamente ou economicamente, suscitou em mim algumas reflexões. Os Ninjas insistem que sua rede não é uma empresa, mas caminham com quatro modelos de financiamento por crowdfunding (pequenas doações, doações pontuais, doações por pautas e assinaturas). A velha imprensa não consegue extrair boas explicações dos Ninjas. Veja o Roda Viva, abaixo, e tire suas conclusões, porque eu continuo com inúmeras dúvidas sobre o assunto.
Devemos fazer jornalismo colaborativo, mas jornalistas precisam de salário e sustento. Crowdfunding basta? Não precisamos mais de empresas? E cadê as alternativas dentro da imprensa corporativa?
Uma das maiores ironias foi que, no dia seguinte ao Roda Viva, ocorreram protestos na Avenida Paulista com aproximadamente 200 pessoas. Organizado pela CUT (Central Única dos Trabalhadores), Força Sindical e UGT (União Geral dos Trabalhadores), a manifestação era contra o Projeto de Lei 4330/2004, que regulamenta a terceirização do trabalho no Brasil.
Tinha alguma informação na Mídia Ninja e na imprensa alternativa? Não, eu encontrei reportagens somente na
Folha de S.Paulo e na EBC, órgãos da grande imprensa.