quinta-feira, 7 de julho de 2011

O fim do News of the World

Uma mancha histórica no jornalismo


O próximo domingo, dia 10 de junho, marcará uma data histórica no jornalismo do século XXI. Nesta data será publicada a última edição do tablóide britânico News of the World, o maior tablóide semanal da Grã-Bretanha, com uma tiragem de 2,8 milhões de cópias semanais e 168 anos de história. O News of the World não encerrará suas atividades devido a uma crise financeira do jornalismo, ou porque ninguém quer mais anunciar no papel. O jornal, um dos mais fortes braços da News Corp. – de Rupert Murdoch – encerrará suas atividades devido a uma avassaladora crise de ética que o atinge há três semanas.

Para quem não se interou do caso: O News of the World vem sofrendo inúmeras acusações de usar meios escusos para conseguir suas informações. Grampos telefônicos, hackear e-mails, contas bancárias, perfis em redes sociais, entre outros. Pior: Os alvos não eram apenas celebridades ou membros da família real. Políticos, empresários, famílias de soldados - no Afeganistão e no Iraque - e até mesmo famílias de vitimas de crimes que se tornaram notórios no país. Todos eles tinham sua privacidade invadida por detetives e hackers contratados pelo jornal. As suspeitas chegam até membros do gabinete do primeiro-ministro Britânico, David Cameron, que sabiam do caso, mas não abriam a boca com medo do dano que o jornal poderia causar as suas carreiras.

Na última quinta feira, James Murdoch, filho de Rupert Murdoch e CEO da News Corp. na Ásia e Europa, anunciou o fim das atividades do tablóide. O caso é espetacular por si só, mas ele se torna literalmente cinematográfico. Um dos pivôs do fim do News of the World é o ator Hugh Grant, um alvo corriqueiro de paparazzi ingleses. Grant usou um gravador escondido para registrar uma conversa informal que teve com um ex-repórter do tablóide, que acabou por confirmar diversos casos de grampos telefônicos. O ator fingiu várias vezes que concordava com as práticas, para que o jornalista desse mais detalhes. Em seguida, Grant entregou a gravação à rede BBC. Foi o golpe de misericórdia no mais polêmico e sensacionalista tablóide britânico.

Esse não será o fim da News Corp., muito menos do jornalismo sensacionalista na Inglaterra ou em qualquer outro lugar no mundo. Mas o que assusta é até que ponto as coisas podem chegar. Se escândalos envolvendo jornais e redes de TV pagando subornos, comprando fontes ou adulterando completamente uma história não são novidade – até pelo contrário – o News of the World cavou um pouco mais no que seria o fundo do poço.

É verdade sim que a reação do grupo de Rupert Murdoch foi na medida certa mas, ao mesmo tempo, uma mancha se imprime agora em todo o jornalismo. Afinal, se eles usaram de tais meios para conseguir informações, não deve ser nenhum tipo de novidade. Daqui pra frente, não vai faltar tiroteio entre fãs e detratores de veículos jornalísticos, até aqui mesmo no Brasil. Frases como “certeza que a Veja ou a Folha fazem a mesma coisa” serão lidas aos montes na internet. E o que mais assusta, é que elas não soam mais tão radicais quanto antes.

Que sempre existiu muita coisa suja na imprensa, disso todos sabem. A internet apenas transportou esta impressão para fora do ciclo de pessoas que trabalham no meio, mas infelizmente é uma discussão que ainda se perde, pelo menos aqui no Brasil, dentro do âmbito político. “O jornal A, apóia partido B, e vice versa”. Não é este o caminho. O caminho é a discussão do jornalismo pelo jornalismo, simplesmente isso. E mais, o Brasil tem que parar com a ridícula mania de achar que qualquer critica a imprensa é uma manobra contra a liberdade de expressão. Liberdade de imprensa dá espaço para o bom jornalismo, mas não o garante. Não estou dizendo que todo santo jornal ou TV têm que ser investigado, afinal, ainda vivemos sob o mantra iluminista de que todos são inocentes até que se prove o contrário. Mas temos sim que discutir o assunto, de forma ampla e honesta. Apenas temo que esta realidade está longe do Brasil.

Um comentário:

Pedro Zambarda disse...

Texto muito bom, muito feliz na argumentação e nos fatos. Necessário para a nossa profissão.

Parabéns, Thiago.

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