segunda-feira, 8 de abril de 2013

Porque devemos, sim, tirar Marco Feliciano da Comissão de Direitos Humanos

Em um vídeo postado no dia 7 de abril de 2013, o pastor de deputado Marco Feliciano, presidente da Comissão de Direitos Humanos, disse que "Deus matou John Lennon", o ex-integrante da banda de rock Beatles. Para o religioso, os três tiros que mataram Lennon representam o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Dogmas cristãos em um assassinato. Marco Feliciano também disse que homens de descendência negra são uma linhagem amaldiçoada de Noé, o que justificaria atrocidades cometidas contra o continente.


As declarações de Feliciano fizeram diversas pessoas no Brasil todo se manifestarem para a sua retirada da Comissão dos Direitos Humanos. Outros indivíduos, no entanto, alegam que as manifestações são infudadas. Marco Feliciano foi eleito 212 mil votos em seu mandato como deputado. Dessa maneira, ele representaria uma boa parcela da população evangélica e cristã no Brasil. E esses religiosos estariam defendendo-o porque ele estaria sendo cerceado em seu direito de liberdade de expressão, mesmo dizendo que um beatle deveria morrer e pregando preconceito contra homossexuais e negros.

Convido-os a uma reflexão sobre o tema.

Como jornalista, eu tive privilégio de ter pelo menos uma dúzia de professores que contribuíram para minha parcela de formação intelectual. Um desses mestres é Luís Mauro Sá Martino, autor do livro Mídia e Poder Simbólico (2003). Esse trabalho de Luís nasceu em novembro de 1998 como um TCC na Cásper Líbero com o nome Mídia e Religião, escrito em dupla com o jornalista Mário Ciccone. Luís Mauro, que foi meu orientador de TCC em 2010, fez um trabalho aprofundado sobre a formação de símbolos que as novas igrejas cristãs fazem através da mídia televisiva e moderna através mensagens que não necessariamente se adequam ao público que existem em outras esferas culturais. Dessa maneira, a tendência é que essas instituições religiosas, de alguma forma, criam nichos que podem eventualmente se expandir, de acordo com o crescimento dessas televisões.

Marco Feliciano pertence a esses grupos, na Igreja Assembleia de Deus Catedral do Avivamento.

Diz Luís Mauro: "A Igreja Católica criou a Rede Vida. A Universal, já proprietária da Record, comprou a TV Mulher. A Igreja Renascer em Cristo tentou comprar a extinta TV Manchete, e por pouco não conseguiu. Outras denominações menos poderosas continuaram sua expansão, conseguindo mais tempo nos canais de TV comerciais, além de serem uma presença fixa entre as estações de rádio. A escolha desse campo não é por acaso. O que se tem, enfim, é a busca, por parte das instituições, de legitimação perante a sociedade, a fim de divulgar suas ideologias".

Ou seja, a eleição de Marco Feliciano na política não está relacionada a um nicho religioso. Esse nicho religioso midiático foi criado como instrumento ideológico, para transmitir ideias que estavam presas em outros formatos de mídia, e para legitimar um discurso em forma de negócio. Os 212 mil votos de Marco Feliciano fazem parte da expansão de um discurso que é uma adaptação, e não necessariamente uma representação fixa de um movimento que existe e é legítimo em si.

Luís Mauro continua o texto, aprofundando a análise: "A luta pelo domínio do campo religioso é uma realidade. Os meios de comunicação oferecem diversos exemplos de como as diversas ideias religiosas digladiam-se na conquista de novos adeptos. Essa violência, ainda que não beire os excessos fundamentalistas, está sempre presente, principalmente no campo simbólico cujo espaço de combate é representado pela mídia".

Dessa forma, se as igrejas cristãs utilizam de mídia e, agora, de política para se representarem, o campo de simbolização é o de um enfrentamento. Mesmo que todos os manifestantes não sejam abertamente ateus, a entrada de um deputado declaradamente preconceituoso cria um precedente para protestos populares. Se Marco Feliciano representa uma ameaça simbólica dentro da política brasileira, que ainda se vale por representações, é democrático e ético, da parte de quem discorda, pedir pela sua renúncia na presidência do Comitê de Direitos Humanos.

Quem acha que esses protestos são ilegítimos de alguma forma, não considera, provavelmente de forma ingênua, a capacidade representativa da religião na sociedade, principalmente como mídia. Não se trata de protestar exatamente contra a igreja, mas sim contra o que sociedade considera errado em suas representações. E parte dessa igreja é sim representada por Marco Feliciano. Se Feliciano adota uma postura combativa, a crítica final não pode ser branda.

EDIT: Vejam abaixo o vídeo que Feliciano comenta sobre John Lennon.

Posts mais lidos