sábado, 1 de novembro de 2008

Orquestra e muita improvisação


Por Pedro Zambarda

Com uma iluminação que dava destaque às colunas gregas da Sala São Paulo, que fica no bairro da Luz, em São Paulo, a noite do dia 25 de outubro foi dedicada a música erudita e aos grandes músicos brasileiros. Regente titular da Orquestra Sinfônica Brasileira (OSB) da cidade do Rio de Janeiro, Roberto Minczuk liderou um espetáculo com diferentes solistas e passando por peças clássicas desde Richard Strauss até Tchaikovsky em uma série chamada Safira, em curso desde o ano anterior. Em São Paulo desde o mês de abril, a série trouxe vários artistas como a cantora soprano australiana Elizabeth Whitehouse, Daniel Binelli, mestre argentino no bandoneón (um instrumento semelhante a concertina ou ao acordeão, mas que é usado em músicas religiosas alemães e no tango), além do chinês Peng Peng, pianista.

Para encerrar esse ciclo paulista e a série, o último convidado e solista foi o violonista Yamandú Costa, gaúcho de Passo Fundo. Antes da entrada do convidado, o maestro Minczuk executou Abertura Festiva, Opus 96, do compositor soviético Dimitri Shostakovich - música feita para o 37º aniversário Revolução Soviética, em 1954, tendo sido feita poucos dias antes de sua estréia. Ao fim dessa abertura estavam aquecidos todos os integrantes da orquestra, composta violinistas, violoncelistas, contrabaixistas, violeiros, flautistas, clarinetistas, flautistas, trompetistas, trombonistas e percussionistas.

Yamandú, vestido com roupas brancas e um típico lanço vermelho dos gaúchos no pescoço, subiu ao palco e mostrou, sem a presença do maestro Roberto Minczuk, uma peça totalmente autônoma e baseada em improvisações. Trata-se da Fantasia para Violão de Sete Cordas, uma composição feita com o músico e também violonista de sambas e choros Paulo Aragão, membro do Quarteto Maogani. A apresentação feita por Yamandú, repleta de suas influências de bossa nova e escalas feitas em velocidade rápida, marcou a estréia da peça, tocada pela primeira vez no espetáculo com a OSB no último dia 25.

Concentrado, ora de olhos fechados, ora com os dedos que desapareciam entre as 7 cordas de seu violão, Yamandú mostrou ao público porque é chamado pelo maestro alemão Kurt Masur de o “Paganini do violão”: assim como o violinista XIX, o movimento rápido e preciso do violonista, gerando sons de locais totalmente distintos, mas harmônicos, mostra que é um virtuose, um verdadeiro mestre de seu instrumento, provavelmente o melhor do Brasil. A orquestra, fazendo uma melodia de fundo distinta e mais clássica, deu ao musical regionalista e eclético de Yamandú um resultado cativante ao público, que bradou e bateu palmas quando encerrou sua Fantasia.

"Vocês não precisam nem pedir bis” proclamou o maestro Roberto Minczuk, dando mais tempo de apresentação ao solista, quando já passava de 1 hora de espetáculo. “Ai meu Deus do céu” disse Yamandú Costa, suando, mas ainda com energia para tocar seu violão. Em uma segunda improvisação, Yamandú não teve acompanhamento da orquestra e usou, para complementar seus acordes de bossa e várias passagens acústicas que lembravam músicas do Rio Grande do Sul, batidas fortes no corpo do violão e assobios. O que se presenciou nessa parte da apresentação foi uma peça agressiva, cujas cordas vibravam de acordo com o ímpeto do músico, como extensão natural de seu corpo e de sua alma múltipla e claramente caótica. Com apenas 28 anos, Yamandú Costa terminou sua parte no espetáculo de estréia de Fantasia para Violão de Sete Cordas e de encerramento da série Safira com 5 minutos ininterruptos de aplausos, mostrando-se, reconhecidamente, um dos melhores instrumentistas (e um dos mais jovens) do Brasil.

Após um breve intervalo, o maestro Roberto Minczuk subiu ao palco para a segunda apresentação exclusiva da orquestra, pois a primeira foi sua abertura. Em uma peça repleta de iluminação e espiritualidade, a Sétima Sinfonia em Lá Menor, Opus 92, do clássico compositor erudito Ludwig Van Beethoven, foi executada em quatro partes distintas. Poco sostenuto – Vivace abriu a composição alternando entre passagens extremamente pausadas para uma velocidade entre 150 e 170 batidas por minuto, repleta de melodia e harmonia musical (a velocidade “vivace”). Logo após essa entrada alternada, a segunda parte, Allegretto, igualou a velocidade total da música, situando-a pouco abaixo do chamado “allegro” (entre 120 e 170 batidas por minuto). Logo após essa parte, Presto surgiu para, acima da velocidade “vivace”, executar uma música muito rápida e até mesmo agressiva, elevando as batidas para entre 170 e 200 batidas por minutos. Por fim, Allegro con brio encerrou a composição em uma tonalidade digna da obra de Beethoven, mantendo uma velocidade alta, mas também com um “brilho” que foi constantemente resgatado em Poco sostenuto – Vivace.

Com essas duas performances distintas, tanto da Orquestra Sinfônica do Rio de Janeiro liderada por Minczuk quanto o violão de 7 cordas de Yamandú Costa, presenciou-se um espetáculo musical riquíssimo em repertório instrumental, sem coros ou letras cantadas. Seja nas cordas de náilon que Yamandú constantemente afinou e trocou (ele mudava principalmente o tom da sétima corda, para conseguir improvisações impossíveis com 6 cordas), seja nos ataques agressivos dos violinos e violoncelos coordenados pelo maestro Roberto Minczuk, o público pôde aproveitar uma noite rica em detalhes, subjetiva para a imaginação e inesquecível.

2 comentários:

André Sollitto disse...

Yamandu Costa é um gênio!

Pedro Zambarda disse...

Era bom demais ver um erudito popular vários eruditos clássicos no mesmo palco.

Quem tem genialidade, tem genialidade.

Posts mais lidos