quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Você é feliz?

“Você é feliz?”
A pergunta foi dispara assim, à queima-roupa. Ela olhou para o homem. Barba e bigode compridos, roupas simples, um crachá de imprensa no pescoço e dois vesgos olhos azuis perdidos em um rosto magro.
Ela pensou um pouco e respondeu: “sou”.
“Essa pergunta pega as pessoas de jeito, não? Você manja de rock?”
“Um pouco.”
“Já ouviu falar de uma banda de rock chamada The Beatles?”
“Lógico, como não?!”
“Conhece o Álbum Branco dos Beatles?”
“Conheço.”
“Nesse álbum existe uma música, Happiness is a Warm Gun. Conhece essa música? Vou cantar um pedacinho para ver se você lembra...”
“Conheço sim.”
“De rachar o melão essa música, não?”
Ele virou para a outra moça.
“Onde você comeu hoje?”
“Aqui mesmo.”
“O que você comeu de bom?”
Ela riu, mostrando o aparelho. Ele continuava sério.
“Comi arroz, feijão, berinjela...”
“Estava bem preparada, a berinjela?”
“Estava...” Ela riu mais um pouco, achando graça daquele interrogatório.
“Devia estar mesmo. Posso fazer inveja a vocês agora? Sabe onde eu comi?”
A pergunta era mais ou menos direcionada à garota de aparelho nos dentes, pois seus vesgos olhos azuis continuavam fixos nela.
“Não sei... No Viena?”
“Por que Viena? Grande merda. Comi no Bom Prato. Gastei um único real e comi muito...” Ele não teve tempo de continuar. Havíamos sido chamados. Pedimos licença, fomos embora. Antes de entrar na sala onde eu perderia duas horas de minha vida aprendendo coisas que jamais usaria de novo, olhei para trás. O homem já se dirigia para um outro grupo de pessoas, aglomeradas ali perto.

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