sábado, 25 de julho de 2009

De frente com a Pantera

Maria Alice Vergueiro tem mais de cinquenta anos no teatro, mas ganhou fama com um vídeo simples na internet. A diva do underground virou a velha dama indigna da maconha

Por Danilo Braga

“Claro que eu não faço apologia da maconha! Acho que quem quiser fumar fuma. Quem não quiser, não fuma...” Ela é a maconheira de Higienópolis, a diva do underground que foi salva do ostracismo pelo YouTube, pela erva (“todos os dias, sem pular nenhum") e pela arte. Ela é Maria Alice Vergueiro.

Maria Alice é atriz. Nasceu também no underground do teatro paulistano, mostrando o talento em diversos improvisos e montagens nos quase palcos do submundo teatral. Na parte de cima da vida, onde há luz, semáforos e legislação ela é reconhecida por um dos seus papeis mais simples e legítimos de sua carreira: a Pantera.

Ela recebe visitas no apartamento de mais de trezentos metros quadrados, bem localizado em Higienópolis. Surge na sala de visitas apoiada em uma bengala. A tremedeira chama a atenção no instante em que ela tenta se controlar. Não é uma ansiedade, não é a inquietação da atriz: é o Mal de Parkinson consumindo o corpo datado com 74 anos de idade, mas não derrotando-a. Sorri para os convidados como se os tivesse visto crescer. A mãos macias e quentes, acolhedoras são sedutoras: ela ainda é a diva.

O pai foi um dos líderes da Revolução Republicana. Morreu aos 47 anos, alimentando a rebeldia e a fome de arte de Maria Alice. A família foi contra essa decisão, mas da rebeldia ela não relutou.

A casa de Maria Alice evidencia a riqueza herdada da família. Móveis coloniais, pinturas com alarme anti-roubo. Ao lado de um abajur com cúpula de seda, uma cadeira de rodas elétrica e bem equipada indicam a velhice que atingiu a diva, que é mortal e feita de carne e osso. “Eu comecei a discutir comigo mesma essa questão da velhice, da aposentadoria e do Parkinson. Eu estou com início de Parkinson, e senti que não gostaria de esconder essa... não diria decriptude, mas é que a elite passa a ter um tabu de que você é culpado por estar velho.” A velhice é um de seus assuntos preferidos.

Maria Alice vive com a mãe, de 95 anos de idade. Sobrevive com a pensão que o Estado paga, será interrompida quando sua mãe morrer. Para reforçar o caixa, vende ocasionalmente jóias da família. “Mas não quero pensar nisso”.

Maria Alice toma o chá de margarida com seus convidados. É difícil identificar onde exatamente está a personagem da Pantera uma vez que a atriz é natural e autêntica em suas opiniões sobre a droga. A maconha é outro de seus assuntos preferidos.
“Eu também cheguei a um ponto que eu não tenho mais o que perder depois que eu virei uma maconheira que mora em Higienópolis, de 74 anos.” Se é a favor da liberação? Diz que não pode liberar, mas também não se deve proibir. “É preciso acabar com esse tabu. Quem usa isso não são os fudidos do morro ou a moçada, e sim os grandes cartéis, as cambadas dos banqueiros”, confessa a atriz, que diz estar há 27 anos sem tocar em uma gota de álcool.

“Tapa na Pantera” fez do anonimato da atriz, a notícia. Dos impactos que o vídeo causou, o que mais incomodou foi o da família. “Minha filha não fala mais comigo desde o vídeo. É engraçado. Quando você pensa que deu uma educação livre, que cada um faz o que quer, a outra me vira e me dá um ignorada, para eu aprender. Eu acho que o importante é exatamente isso, fazer e mostrar.” Os netos apoiaram e aplaudiram. “Pai, a vó é muito sem noção”, conta a Pantera.

O filme foi uma criação coletiva, que surgiu durante uma reunião entre Maria Alice e os estudantes de cinema da FAAP, Rafael Gomes, Esmir Filho e Mariana Bastos. Estavam em sua casa para fazer o trabalho de conclusão de curso. Tomavam sorvete e a câmera continuou ligada. Surgiu a personagem na atriz. “Foi uma brincadeira que deu certo”.

O vídeo teve 5 milhões de exibições. “O sucesso se deu por causa da dúvida se aquilo era verdade ou não. Porque aquele espaço foi invadido por uma atriz". E com um simples gesto, responde à pergunta que muitos fizeram: De uma pequena caixa de madeira, tira o seu cachimbo e o acende. “Você quer?”.

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