segunda-feira, 9 de março de 2009

O mais novo injustiçado do Oscar: Frost/Nixon

Dentre os muitos traumas da história americana, o maior deles responde com certeza pelo nome de Richard M. Nixon. O presidente responde pelo caso mais vergonhoso da verdadeira instituição que é o seu cargo nos EUA, sua renúncia em 1974 em decorrência das investigações que se seguiram ao caso Watergate. E talvez este trauma seja uma das poucas explicações plausíveis de como Frost/Nixon saiu de mãos vazias do Oscar 2009. O filme de Ron Howard – adaptação da peça montada por Peter Morgan – é o mais novo e um dos mais representativos exemplares dos thriller que tratam da comunicação, equiparando-se a obras como Rede de Intrigas de Sidney Lumet. E mais, é superior a pelo menos 3 dos filmes que concorriam ao Oscar de melhor filme (não posso comentar Milk por ainda não ter visto).

O filme conta em forma semi-documental todo o processo que envolveu a entrevista que o então ex-presidente Nixon concedeu ao apresentador britânico David Frost em 1977. A entrevista acabou se tornando o evento jornalistico de maior audiência na história da TV americana, com números imbatíveis até hoje. O acontecimento foi um marco na vida de ambos os personagens. David Frost não era um jornalista respeitado ou algo do tipo, e sim um apresentador de shows de entretenimento na Inglaterra e Austrália. Enquanto Richard Nixon vivia inquieto com sua aposentadoria forçada, algo impensável para um homem que acreditava que “o que dá sentido à vida é um objetivo”. Em uma comparação leiga, é como se nos dias de hoje, Fernando Collor concedesse uma entrevista única para Fausto Silva. Um lutava por uma credibilidade inédita em uma terra estrangeira e hostil, enquanto outro via sua última oportunidade de limpar seu nome na história.

Dentre os vários êxitos da produção - entre eles o roteiro muito bem amarrado, a trilha sonora feita sob medida e a reconstrução perfeita de cenários da época – está a direção de Ron Howard. O diretor americano traz aqui seu melhor trabalho da sua bem-sucedida mas inconstante carreira. Sabendo da força de seu tema, o diretor adota uma postura firme, sem nenhum tipo de sentimentalismo que poderia colocar tudo a perder. Além do já comentado semi-documentário, Howard usa muito bem outro artifícios clássicos em filmes do gênero como close-ups, alternância de câmeras e imagens fortes – destaque para o aperto de mão que Nixon dá no personagem de Sam Rockwell, que negara tal fato poucos segundos antes - além de recriar muito bem imagens reais, como a despedida de Nixon da casa branca

No entanto a grande força de Frost/Nixon está em seu elenco extremamente eficiente. Liderado por Michael Sheen e Frank Langella, os produtores conseguiram reunir um ótimo time de coadjuvantes como Kevin Bacon, Oliver Platt, Sam Rockwell e Rebecca Hall, que surgem como os assessores de Nixon e Frost. E seus papeis não poderiam ser mais emblemáticos, já que no fim das contas, seus personagens surgem como esferas girando ao redor da orbita de Sheen e Langella, as forças motoras do filme. Nenhum dos dois são extremamente parecidos com as pessoas reais, no entanto, tudo que aqueles homens eram em seu interior está representado com perfeição na tela. Sheen transmite todo o charme, entusiasmo e magnetismo do verdadeiro David Frost. No entanto, no momento certo, tudo dá lugar à insegurança diante daquele momento único. Em nenhum momento o Frost de Sheen se torna algo maior do que o verdadeiro foi. Já Frank Langella merece um parágrafo à parte.

Quando me referi à comparação entre Nixon e Collor como leiga, o principal motivo dela é que Fernando Collor nunca foi um homem comparável à Richard Nixon. Enquanto o primeiro chegou à presidência da República como um para-quedista, o segundo travou uma batalha de anos até chegar lá. Amargou várias derrotas, e em dado momento virou piada nacional, após a derrota para Kennedy. Chegando lá, enfrentou uma guerra que já se encontrava muito mal encaminhada, uma revolução social eclodindo em seu país e uma guerra fria crescente. Não cabe neste texto julgar os anos Nixon, mas no fim é evidente que aquele era um homem de alto nível intelectual, com uma postura no mínimo complexa. Desde o momento que vemos pela primeira vez a imagem de Frank Langella no filme, subindo no avião e se despedindo da mesma forma que Nixon fez, percebemos que aquela não é uma interpretação comum.

Embora os traços físicos de Nixon não estejam ali, seu espirito está assustadoramente presente. Sua presença poderosa, a voz imponente e a capacidade de crescer em cima de outro oponente. Assim como Sam Rockwell diz em dado momento do filme, Langella “cresce 6 polegadas quando precisa, esmagando quem está a sua frente”. Mas dentre os vários momentos emblemáticos de sua interpretação, um merece ser ressaltado. Uma única expressão, captada em close por Ron Howard, que revela todo o furação de sentimentos no interior daquele homem, que não se deixava ser filmado em momento de fraqueza, na hora em que vê sua batalha como perdida. Um único olhar. Olhar que além de definir o vencedor daquele embate histórico, pode ter sido também o responsável pelo trauma da america à Nixon. Talvez Frank Lagella construiu alguém maior que o próprio homem, mas isso poucos podem dizer. O fato é que o ator que poucos lembravam deu o seu canto do cisne em Frost/Nixon e se tornou o mais novo injustiçado do Oscar.

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