A vida como Performance percorre a carreira de cineastas como Orson Welles, com uma trajetória crítica e inovadora bem pessoal, até ícones da dramaturgia como Bertold Brecht, dono de um teatro fortemente politizado, típico da esquerda política mundial.
Por Pedro Zambarda de Araújo
Quando um crítico aborda com mais paixão seu objeto de observação, podemos visualizar isso notadamente em suas palavras, fruto de escolhas subjetivas. Kenneth Tynan, muito além dessa seleção que deduz atração ou repulsão às pessoas abordadas em seus perfis, valoriza a atuação de seus entrevistados.
Exímio escritor sobre os palcos, desde a adolescência em Birmingham, não foi à toa que Tynan produziu Oh! Calcutá!, em 1967, pioneiro na arte da nudez na Broadway norte-americana. Essa produção nos teatros provavelmente explica a admiração dele por Louise Brooks, a última perfilada no livro, que é conhecida por papeis pornográficos e bem pessoais, especialmente no filme A Caixa de Pandora, filmado em 1928.
Para explorar a vida de Brooks, além da investigação biográfica, ele entrevistou pessoalmente com a atriz, em 1979, quando ela já havia abandonado os palcos. Com esse perfil, Kenneth Tynan explica o conteúdo de outros perfis. Greta Garbo é retratada no livro como uma atriz que é sedutora em sua essência, que encanta o que está ao seu redor, apesar de ter um tipo de “masculinidade” nessa iniciativa de apreciar ao redor, que intimida as mulheres. Para ele, Garbo poderia ter feito papeis mais marcantes com esse tipo de carisma. Por outro lado, há a estrela extremamente acessível que foi Katherine Hepburn, segundo a abordagem do crítico inglês. Ambas são estabelecem um comparativo interessante com Louise Brooks.
Além dessa comunicação entre perfis escritos em tempos distintos, há também os textos que se sustentam sozinhos e ainda demonstram recursos metafóricos do autor para explicar não apenas biografias. Quais são? Antonio Ordóñez e Miles Davis.
Pela história do jazzista, especialista no trompete e em apresentações que mostram seu ego intimidador como músico, Tynan também expõe sua vida pessoal, onde Davis se desarma da personalidade que adota nos shows. É uma história de um homem que forja, explicitamente, um personagem, embora possua uma vida privada que destoa desse quadro geral, que não poderia existir num convívio íntimo.
O toureiro espanhol Ordóñez é oposto a Miles Davis, pois ele dialoga com o animal na arena como se ele fosse, de fato, tão humano quanto ele. Tamanha humildade e sincronia de Antonio Ordóñez com o espectador, que é feito um contato íntimo do matador de animais com uma arte teatral mais afetiva e didática, nas palavras de Tynan. O toureiro não abate o touro, mas permite que ele mostre seu vigor de combate, seu ápice público. Ele tem um amor pela criatura que assassina, uma honra que passa do irracional para nossos sentimentos mais pessoais.
Do teatro inglês mais tipicamente shakespeariano, Alec Guiness é um excelente ator e exemplo da categoria, que abre os textos de Kenneth Tynan textos nesse livro. Extremamente pensativo e com capacidade de transmitir intelectualidade pelo palco, seja interpretando clássicos como Irmãos Karamazov ou Ricardo III, Guiness vai ser um dos raros homens que conseguiu fazer uma transição para o cinema sem perder essas características marcantes.
O perfil feito por Tynan, de 1952, não captaria o Alec Guiness de Star Wars IV: Uma Nova Esperança, longa-metragem de George Lucas, em 1977, onde ele interpreta um sábio mestre jedi sem perder seus ares teatrais. Acaba sendo um ícone de Hollywood, já em idade avançada, sem perder o carisma que o consagrou nos palcos.
Pela história de Guiness, chegamos em mais três atores que, além de terem marcado a vida de Kenneth Tynan, mostram atuações completamente diversas sobre Shakespeare. John Gielgud, Laurence Olivier e Ralph Richardson são, além de interpretes de renome, representantes de estilos distintos.
Gielgud interpreta um estilo romântico de personagem, com carga passional forte e um significado além do carnal que prevalece. Tynan reforça esses traços de Gielgud em protagonistas espirituosos, como Romeu, na maior tragédia shakespeariana, ou Hamlet, o puro que enfrenta um tio malicioso que assassinou seu pai.
Completamente oposto, Lawrence Olivier mostra uma atuação de Otelo austera, orgulhosa. No viés desse ator, também aceito pelo diretor em 1963, a peça sobre a suposta traição de Desdemona pelo favoritismo a Cássio teria desenvolvimento não apenas graças à Iago, que convence Otelo de mentiras segundo a história original, mas também por culpa do ego do protagonista. Lawrence é um Otelo orgulhoso, que domina o público pelos seus olhos ardilosos, pelas explosões de fúria no palco, ao ser contrariado.
Richardson parece um meio-termo entre ambos, nunca tomando um tipo extraordinário em papeis extraordinários dentro do complexo das obras de Shakespeare. No entanto, dentro de papeis considerados secundários, Ralph Richardson mostra uma atuação que contagia por sua emoção mais fiel à sanidade, por uma simplicidade que destoa da complexidade que é atuar no teatro shakespeariano, repleto de personagens tipicamente loucos.
Com esses perfis, e outros como George Jean Nathan, Edith Evans até o católico Graham Greene, Kenneth Tynan traça, do particular ao público, a vida dos espetáculos na primeira metade do século XX. Traz, conectando seus textos, um repertório rico para pessoas que não vivenciaram o período, tanto nas televisões quanto nas apresentações teatrais. Investiga a genialidade de Tennesse Williams falando do homem anti-social dentro do escritor, que se destaca por uma solidão criativa. Fala sobre as inúmeras mortes que sofre o ator Humphrey Bogart no cinema, considerando seu vigor em lutar corajosamente contra o câncer que o matou, em 1957, após definhá-lo.
A Vida como Performance é um livro sobre imagens, que parece sugerir o movimento dos homens do palco sem recorrer aos textos cansativos e extremamente detalhistas. Essa cultura visual normalmente sugere uma superficialidade das ações. Nos perfis de Tynan, ela é a via para os pensamentos contraditórios e brilhantes desses astros atualmente esquecidos pelo contexto histórico, com o declínio do teatro e a ampliação da cultura televisiva.
Por Pedro Zambarda de Araújo
Quando um crítico aborda com mais paixão seu objeto de observação, podemos visualizar isso notadamente em suas palavras, fruto de escolhas subjetivas. Kenneth Tynan, muito além dessa seleção que deduz atração ou repulsão às pessoas abordadas em seus perfis, valoriza a atuação de seus entrevistados.
Exímio escritor sobre os palcos, desde a adolescência em Birmingham, não foi à toa que Tynan produziu Oh! Calcutá!, em 1967, pioneiro na arte da nudez na Broadway norte-americana. Essa produção nos teatros provavelmente explica a admiração dele por Louise Brooks, a última perfilada no livro, que é conhecida por papeis pornográficos e bem pessoais, especialmente no filme A Caixa de Pandora, filmado em 1928.
Para explorar a vida de Brooks, além da investigação biográfica, ele entrevistou pessoalmente com a atriz, em 1979, quando ela já havia abandonado os palcos. Com esse perfil, Kenneth Tynan explica o conteúdo de outros perfis. Greta Garbo é retratada no livro como uma atriz que é sedutora em sua essência, que encanta o que está ao seu redor, apesar de ter um tipo de “masculinidade” nessa iniciativa de apreciar ao redor, que intimida as mulheres. Para ele, Garbo poderia ter feito papeis mais marcantes com esse tipo de carisma. Por outro lado, há a estrela extremamente acessível que foi Katherine Hepburn, segundo a abordagem do crítico inglês. Ambas são estabelecem um comparativo interessante com Louise Brooks.
Além dessa comunicação entre perfis escritos em tempos distintos, há também os textos que se sustentam sozinhos e ainda demonstram recursos metafóricos do autor para explicar não apenas biografias. Quais são? Antonio Ordóñez e Miles Davis.
Pela história do jazzista, especialista no trompete e em apresentações que mostram seu ego intimidador como músico, Tynan também expõe sua vida pessoal, onde Davis se desarma da personalidade que adota nos shows. É uma história de um homem que forja, explicitamente, um personagem, embora possua uma vida privada que destoa desse quadro geral, que não poderia existir num convívio íntimo.
O toureiro espanhol Ordóñez é oposto a Miles Davis, pois ele dialoga com o animal na arena como se ele fosse, de fato, tão humano quanto ele. Tamanha humildade e sincronia de Antonio Ordóñez com o espectador, que é feito um contato íntimo do matador de animais com uma arte teatral mais afetiva e didática, nas palavras de Tynan. O toureiro não abate o touro, mas permite que ele mostre seu vigor de combate, seu ápice público. Ele tem um amor pela criatura que assassina, uma honra que passa do irracional para nossos sentimentos mais pessoais.
Do teatro inglês mais tipicamente shakespeariano, Alec Guiness é um excelente ator e exemplo da categoria, que abre os textos de Kenneth Tynan textos nesse livro. Extremamente pensativo e com capacidade de transmitir intelectualidade pelo palco, seja interpretando clássicos como Irmãos Karamazov ou Ricardo III, Guiness vai ser um dos raros homens que conseguiu fazer uma transição para o cinema sem perder essas características marcantes.
O perfil feito por Tynan, de 1952, não captaria o Alec Guiness de Star Wars IV: Uma Nova Esperança, longa-metragem de George Lucas, em 1977, onde ele interpreta um sábio mestre jedi sem perder seus ares teatrais. Acaba sendo um ícone de Hollywood, já em idade avançada, sem perder o carisma que o consagrou nos palcos.
Pela história de Guiness, chegamos em mais três atores que, além de terem marcado a vida de Kenneth Tynan, mostram atuações completamente diversas sobre Shakespeare. John Gielgud, Laurence Olivier e Ralph Richardson são, além de interpretes de renome, representantes de estilos distintos.
Gielgud interpreta um estilo romântico de personagem, com carga passional forte e um significado além do carnal que prevalece. Tynan reforça esses traços de Gielgud em protagonistas espirituosos, como Romeu, na maior tragédia shakespeariana, ou Hamlet, o puro que enfrenta um tio malicioso que assassinou seu pai.
Completamente oposto, Lawrence Olivier mostra uma atuação de Otelo austera, orgulhosa. No viés desse ator, também aceito pelo diretor em 1963, a peça sobre a suposta traição de Desdemona pelo favoritismo a Cássio teria desenvolvimento não apenas graças à Iago, que convence Otelo de mentiras segundo a história original, mas também por culpa do ego do protagonista. Lawrence é um Otelo orgulhoso, que domina o público pelos seus olhos ardilosos, pelas explosões de fúria no palco, ao ser contrariado.
Richardson parece um meio-termo entre ambos, nunca tomando um tipo extraordinário em papeis extraordinários dentro do complexo das obras de Shakespeare. No entanto, dentro de papeis considerados secundários, Ralph Richardson mostra uma atuação que contagia por sua emoção mais fiel à sanidade, por uma simplicidade que destoa da complexidade que é atuar no teatro shakespeariano, repleto de personagens tipicamente loucos.
Com esses perfis, e outros como George Jean Nathan, Edith Evans até o católico Graham Greene, Kenneth Tynan traça, do particular ao público, a vida dos espetáculos na primeira metade do século XX. Traz, conectando seus textos, um repertório rico para pessoas que não vivenciaram o período, tanto nas televisões quanto nas apresentações teatrais. Investiga a genialidade de Tennesse Williams falando do homem anti-social dentro do escritor, que se destaca por uma solidão criativa. Fala sobre as inúmeras mortes que sofre o ator Humphrey Bogart no cinema, considerando seu vigor em lutar corajosamente contra o câncer que o matou, em 1957, após definhá-lo.
A Vida como Performance é um livro sobre imagens, que parece sugerir o movimento dos homens do palco sem recorrer aos textos cansativos e extremamente detalhistas. Essa cultura visual normalmente sugere uma superficialidade das ações. Nos perfis de Tynan, ela é a via para os pensamentos contraditórios e brilhantes desses astros atualmente esquecidos pelo contexto histórico, com o declínio do teatro e a ampliação da cultura televisiva.
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