Por Laís Clemente
No dia 19 de junho, terá início o Bridgestone Music Festival. O evento ocorrerá no Citibank Hall, em São Paulo, e tem a pretensão de, em três dias, inserir a platéia no universo de um estilo musical de fronteiras nada bem definidas, a world music.
Numa mal feita tradução, o gênero significaria “música do mundo”. Assim, estariam nele inclusas toda a produção musical do planeta, o que não faria dela uma categoria, pois, até onde os cientistas têm conhecimento, não há produção musical fora deste planeta. Este “mundo” a que o termo faz menção, seria então o de uma realidade distinta da do ponto tomado como referencial, o centro da cultura dominante, que no caso seria a dos mais importantes países de língua inglesa: Estados Unidos e Inglaterra.
Esses países sim, possuem o jazz, o blues, o folk, e o rock’n roll em todos os seus incontáveis desdobramentos. Quanto aos estilos do resto do mundo? Bem, o resto...o resto é world music, um saco sem fundos onde foram colocados o fado português, o bolero, o africano kora, os brasileiros samba, bossa nova e tropicália, e até mesmo ritmos que tiveram grande influência na base rítmica da música popular americana, como a música cubana.
Esse termo classificatório foi criado por um grupo de empresários de gravadoras em 1987. Vendo o interesse crescente pelo som produzido por músicos não ocidentais, como Thomas Mapfumo, natural do Zimbábue, eles inventaram o termo e saíram em espécie de campanha para popularizar a world music (o termo, não exatamente seus representantes). A intenção era garantir que o potencial comprador de um álbum de, por exemplo, música indiana, encontrasse o disco com facilidade nas lojas, assegurando a venda e os lucros das gravadoras.
Essa intenção inicial acabou nivelando todos os ritmos que a categoria abrange por terra, dando margem a uma preguiçosa forma de classificação para críticos musicais e donos de selos. Tudo o que não for de língua inglesa, é world music.
Se lembrarmos do tamanho do ego que a cultura americana tem, fica até compreensível o porquê do termo ter virado hábito nesse país. Mas por que o resto do mundo, que tem seus estilos regionais enquadrados na world music, também se utiliza dessa nomenclatura? Certamente nenhum brasileiro diria que a Bossa Nova é um exemplar do “gênero”, mas ao falar de estilos, mesmo que de países vizinhos, lá está a “música do mundo”. Duvida? Faça uma experiência: entre na loja de discos mais próxima de sua casa e veja o que há nessa seção. Provavelmente encontrará bandas mexicanas, grupos cubanos e até mesmo músicos da nossa vizinha Argentina.
No Brasil, enxergamos a cultura de outros países do mesmo modo que americanos e ingleses enxergam a nossa. Queremos reconhecimento internacional, reclamamos quando representam Rio de Janeiro como a capital da Argentina, mas tratamos outras culturas, mesmo que próximas da nossa, com descaso semelhante.
É aí que entram iniciativas como a do Bridgestone Music Festival. Apesar de reafirmar a nomenclatura world music, a tentativa do Bridgestone é trazer esse world para mais perto dos brasileiros. Com apresentações como as do cantor e guitarrista Daby Touré – que explora em seu trabalho as fronteiras da música africana com o jazz - e da argelina Souad Massi - que tem seu trabalho influenciado por música clássica árabe, pop argelino, folk e soul music -, a esperança é que, quem sabe, após muitos anos de festivais como esse, o termo “música do mundo” caia por terra e, ao menos nós brasileiros, comecemos a realmente discernir a infinidade de sons hoje identificados pelas mesmas vãs palavras.
Imagem 1: logo do Bridgestone Music Festival
Imagem 2: Souad Massi, cantora argelina que é uma das principais atrações do festival.
5 comentários:
Vou comentar só por comentar. :o)
Você já sabe o que tenho a dizer sobr eo texto...
É um texto bom que, afirmo, veio sem erros.
Excelente proposta pra ensaio, Lalis!
Pediram-me encarecidamente (barulho de chicote) que comentasse melhor o texto.
Eu gostei bastante do texto, gosto do tom descolado (daquele que paga uma rodada bla bla bla), e da reflexão que propõe... O fato de não responder às perguntas, creio eu, colabora para a própria argumentação.
E paralelos: world music é como a seção de cinema europeu nas locadoras.
há, eu vou, eu vou!!
Ah, que bacana Fernando!
Não esquece de contar pra gente como é que foi depois, tá?
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